6 min de leitura

Grandes líderes fazem perguntas que integram o time

Deixe de lado a cultura do “falar e fazer” e abrace a da apreciação e humildade. É isso que leva à inovação e à sustentabilidade

Suelen Schneider
30 de julho de 2024
Grandes líderes fazem perguntas que integram o time
Este conteúdo pertence à editoria Liderança e cultura Ver mais conteúdos
Link copiado para a área de transferência!

Um dos nossos maiores problemas é a cultura do “falar e fazer”. Expressão e comunicação são vitais para a liderança, mas há pessoas que valorizam mais a sua própria opinião do que a dos demais integrantes do time. Para elas, expressar sua visão, baseada ou não em dados, convencer os outros e mostrar que estão certas são vitórias que alimentam o ego.

O “falar e fazer” contribui para ganhos de curto prazo, especialmente em situações emergenciais. Lembro do evento da greve dos caminhoneiros de 2018. A situação era realmente caótica, demandando reações rápidas e autoritárias das lideranças das empresas afetadas, sobretudo aquelas cuja operação envolvia animais, produtos altamente perecíveis ou medicamentos para unidades de emergência dos hospitais. O caso ilustra uma necessidade de sobrevivência no curtíssimo prazo. Não há tempo para que as lideranças pensem, envolvam todas as pessoas ou discutam todas as possibilidades.

Mas foi uma situação atípica. Os líderes devem estar preparados para ela, mas esse não pode ser o modus operandi nas organizações. Isso porque a cultura do “falar e fazer” tende a fechar as portas para que as pessoas contribuam e inovem. Diversos estudos recentes mostram que a segurança psicológica e a inclusão de opiniões contribuem para motivação, engajamento, criatividade, inovação, confiança e, consequentemente, geração de resultados sustentáveis.

Precisamos desconstruir nosso modelo mental

Atire a primeira pedra quem nunca disse ou ouviu a expressão: “Eu disse que não ia dar certo”. Fazemos isso inconscientemente. Na escola, fomos educados para ter respostas certas sempre na ponta da língua. Nas universidades e escolas de negócios, somos treinados para desenvolver estratégias para resolver problemas. Nesse contexto, nossos líderes foram treinados a direcionar, conduzir, dizer e agir.

Mas será que essa é a maneira mais adequada de liderar? Será que uma única pessoa consegue acessar todas as informações e soluções possíveis para direcionar melhor o time? Não. Primeiro, a racionalidade de cada indivíduo, sendo ou não líder, é limitada. Segundo, cada indivíduo traz consigo vivências, visões, problemas e conhecimentos únicos que, quando combinados com os dos demais, criam soluções abrangentes e inovadoras.

O líder pode criar um ambiente convidativo a contribuições por meio da indagação humilde e apreciativa. Porém, é muito fácil continuar “falando e fazendo” com perguntas. Possivelmente, você já ouviu: “Você está seguindo o plano que discutimos na última reunião?”, “Temos muitas tarefas em vermelho e amarelo neste painel, você pode trabalhar para resolvê-las?” ou “Parece que estamos devagar com este projeto, será que podemos trabalhar mais?”.

O que todas têm em comum? Elas são ordens do chefe e consideram que ele ou ela está sempre com a razão. São baseadas em pressupostos de que as pessoas não estão dando o seu melhor ou, simplesmente, que não fizeram o que deveriam ter feito. Essas perguntas não demonstram curiosidade e interesse. Sobretudo, elas não acessam os motivos por trás dos atrasos, as limitações, as preocupações e as possibilidades para tratar os possíveis problemas.

Perguntar é uma atitude que precisa de prática diária. Por meio dela construímos relacionamentos baseados em curiosidade e interesse sobre a outra pessoa e o que está acontecendo nas organizações.

Para tanto, precisamos controlar o julgamento e ouvir ativamente. Isso exige esforço individual, autoconhecimento e consciência social. A indagação humilde e apreciativa que proponho combina o trabalho do dr. Edgard Schein, professor do MIT Sloan School of Management e cofundador do Organizational Culture and Leadership Institute, e do Dr. David Cooperrider, professor na Case Western Reserve University e cofundador do Appreciative Inquiry Institute.

Aprimorando perguntas e relacionamentos

Sempre há um jeito melhor de fazer perguntas. Os fatores-chave são criatividade, humildade e apreciação. É preciso ter interesse e curiosidades genuínas para entender o que a outra pessoa tem a dizer. Assumir nossas vulnerabilidades e ignorância sobre determinados temas.

Relembro o exemplo citado anteriormente, no qual o chefe perguntava se as pessoas estavam “seguindo exatamente o plano combinado”. Uma maneira mais efetiva seria perguntar ao time: “Como vocês estão se sentindo em relação ao projeto?”, “Vocês poderiam me contar mais sobre o que está acontecendo?”, “Podemos juntos reconstruir ou buscar outras soluções para resolver esta situação?”.

Apreciação é o segundo fator que deve ser usado para aprimorar nossas perguntas. Apreciar é considerar que a organização onde você está, ou que as pessoas com quem você está interagindo, têm experiências e competências essenciais, que as levaram à posição em que estão. Cooperrider recomenda que, em vez de fazermos perguntas inquisitivas para descobrir problemas e apontar culpados, façamos perguntas apreciativas para entender quais são os valores, competências e fortalezas dos integrantes do time.

Há quatro perguntas vitais para esse processo: 1) Quais seriam as principais experiências na sua organização que fazem (ou fizeram) você se sentir vivo e engajado? 2) Sem modéstia, o que você mais valoriza em você, no seu trabalho e na sua organização? 3) Quais são os fatores-chave que dão vida à sua organização e que não podem deixar de existir? 4) Imaginando um futuro promissor para a sua organização, qual seria esse futuro e quais mudanças seriam necessárias?

São indagações abertas e convidativas. Elas são feitas com interesse genuíno no outro e no processo exploratório da situação. Também são despidas de preconceitos e julgamentos, o que permite que os membros do time expressem suas preocupações sem medo, explorem alternativas e ancorem o futuro promissor da organização na colaboração e contribuição de todos. Essa mudança simples na postura do líder tem o poder de transformar times e elevar o nível de confiança geral da organização. “

Suelen Schneider
Especialista em liderança, estratégias e operações. Suelen Schneider tem experiência de mais de 20 anos, onde ocupou posições-chave de liderança em uma das maiores empresas do Brasil. Hoje, é consultora empresarial e mentora de líderes na empresa que ajudou a fundar, a MultiConcept. Suelen é doutoranda em Liderança e Mudanças Globais pela Pepperdine na Califórnia, tem mestrado pela FGV e especializações pela University of Califórnia em Irvine, Indian Institute of Management Bangalore na Índia, Yale School of Management nos EUA e Koç Universiti na Turquia. Já conduziu diversas pesquisas relacionadas ao futuro da liderança, participação feminina na liderança e inclusão.

Deixe um comentário

Você atualizou a sua lista de conteúdos favoritos. Ver conteúdos
aqui