Se queremos realmente transformar o setor educacional, não podemos reduzir o termo disruptivo a um sinônimo de inovação
“Precisamos ser direitos: educação disruptiva de verdade precisa transformar serviços caros, e complexos do ponto de vista do consumo, em serviços baratos e simples de serem acessados. Para ser disruptivo de verdade, as edtechs precisam romper o status quo do setor para atender às necessidades futuras de alunos e educadores no acesso a novos mercados.
Quando o professor Clayton Christensen cunhou o termo inovação disruptiva talvez não imaginasse que os dicionários mudassem seus significados para redefinir o termo, saindo de uma ruptura negativa para abraçar novos conceitos.
No entanto, o tempo e o uso corrente do termo deram um entendimento cada vez mais amplo ao seu novo significado. A popularização do termo diminui o preciosismo dos conceitos sustentados por Christensen por trás da palavra, e nos impede atualmente de distinguir as verdadeiras ações e empresas disruptivas.
Clayton Christensen, ao publicar seu artigo Disruptive Technologies: Catching the Wave (1995), planta um novo significado para o termo “”disruptive”” (disruptivo). Em 1997, o livro O dilema da Inovação (The innovator´s dilemma, no original), também escrito pelo professor Christensen, tem como base a teoria que suporta esse novo conceito para disrupção e apresenta três tipos de estratégias: de sustentação, de custo e a disruptiva.
Na estratégia de sustentação, a lógica é focar em fazer bons produtos ainda melhores. Um fabricante de automóveis, por exemplo, produz um carro longo, com mais alguns centímetros, bem como mais largo e com itens a mais de conforto, acrescentando potência de aceleração e que emite menos poluentes. Esse exemplo de estratégia visa sustentar a posição de mercado conquistada por esta marca, além de manter seus clientes, seu status e os paradigmas de seus produtos/serviços.
A inovação é marginal, incremental. É fácil perceber que a nova versão do carro resolve igualmente os problemas centrais do cliente frente à versão anterior, exceto pelo fato da nova versão ser marcada com o ano de produção/modelo, o que garante mais status ao cliente – e maior margem ao fabricante.
Na estratégia de custos o objetivo é vender o mesmo produto/serviço para o mesmo cliente mais barato. Aqui o foco é baixar custos para garantir margem e focar na geração final de caixa. Fabricantes de carros asiáticos fazem isso há décadas ao simplificar processos, materiais, desenhos industriais e cadeias produtivas para em última instância produzirem os automóveis mais baratos do mundo.
Embora o professor Christensen informe que não há absolutamente nada de errado ao seguir essas duas estratégias, as empresas falham ao não perceberem a transformação do mundo e não buscarem novas soluções para novos problemas. Neste sentido, a solução deveria passar pela ruptura de padrões preestabelecidos, de dogmas, de axiomas e do status quo.
Daí vem a estratégia disruptiva, que transforma produtos/serviços caros e complicados de serem usados em produtos/serviços baratos e simples de serem consumidos. O exemplo que o próprio professor Christensen comenta de forma muito didática é o dos computadores.
Os computadores baseados em mainframes da década de 1960 até 1970 eram produtos caros (US$ 2 milhões), complexos e difíceis de serem usados (requerem engenheiros). O surgimento dos computadores pessoais representou a disrupção dos mainframes, pois eram mais baratos (US$ 2 mil) e mais simples de serem usados. Na mesma lógica, os smartphones fizeram a disrupção dos computadores pessoais, pois são ainda mais acessíveis (US$ 200) e muito mais fáceis de serem usados.
Retomados esses conceitos, como identificar a disrupção em edtechs? Será que um marketplace de cursos é disruptivo? E uma aplicação de avaliação? Uma edtech que gamifica os estudos ao dar pontos pelo avanço dos alunos é disruptiva? Uma edtech que segue os mesmos parâmetros do MEC, de todo mercado, e apresenta uma “”nova”” graduação é disruptiva? A resposta para essas e prováveis outras 99% das edtechs é não, elas não são disruptivas.
Isso não significa que essas edtechs sejam ruins, que não simplifiquem processos e melhorem a experiência dos alunos, ou que não modernizem o look and feel do online. No entanto, não dá para afirmar que essas edtechs rompam o status quo do mercado, atendam às necessidades futuras dos clientes e acessem novos mercados.
Por isso, vamos chamar essas edtechs de inovadoras, pois elas não deixam de ser. Contudo, não vamos chamá-las de disruptivas, pois a maioria não é, e devemos estar sempre atentos aos modelos de edtechs que encontramos no dia a dia, procurando fazer, na prática, essa distinção.
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