Segundo um estudo recente realizado pela Korn Ferry, com milhares de executivos em todo o mundo, apenas 2% dos líderes brasileiro são inclusivos. Como a liderança pode ser mais inclusiva?
Inclusão tem sido um tema de destaque nas empresas, na academia e na mídia, trazendo à tona necessidades expostas por movimentos mundiais que clamam pela igualdade de gênero, raça ou etnia. Essas iniciativas são cada vez mais necessárias e positivas, e já podemos ver alguma evolução. Entretanto, será que os líderes estão aplicando os conceitos de inclusão de maneira efetiva?
Convido você a refletir sobre quantos líderes inclusivos conhece. Qual o percentual da sua rede de networking que é composto por esse tipo de liderança? Se você chegou a um percentual acima de 5%, você é um ponto fora da curva. Talvez você seja simplesmente um privilegiado ou então trabalhe em um ambiente que estimula a inclusão através de forte atuação social.
Umestudo recente realizado pela Korn Ferry com milhares de executivos em todo o mundo mostrou que apenas 5% dos líderes são inclusivos. Quando selecionamos apenas os pesquisados brasileiros, o número cai para 2%. Um dado que impressiona – especialmente se considerarmos que, nos últimos anos, recebemos uma avalanche de informações e treinamentos sobre inclusão e diversidade. Apesar do desejo genuíno das organizações de aumentar a inclusão, ainda há uma lacuna entre o que se prega como liderança inclusiva e o que se pratica.
Antes de seguirmos, é crucial realinharmos o conceito de liderança inclusiva, pois ela não se resume ao aumento de representatividade, diversidade e igualdade. Ela vai muito além.
Dr. Edwin Hollander, visionário e pioneiro do tema, diz que a liderança inclusiva é construída através de relacionamentos que trazem benefícios mútuos aos líderes e liderados. A essência da inclusão em liderança é “fazer as coisas com as pessoas, em vez de fazer as coisas pelas pessoas”. É exatamente nesse ponto que os líderes mais falham. Por exemplo, quando um chefe direciona seus subordinados dizendo-lhes o que fazer, ele está agindo pelas pessoas. Ele assume o papel de comandante.
Indo ao extremo oposto, conheço líderes que dão aos seus colaboradores avaliações de performance excepcionais, mesmo sabendo que precisam melhorar em diversos aspectos. Eles fazem isso ou para não desmotivá-los, ou para não ter que enfrentar sessões difíceis de feedback. Novamente, isso não é inclusão, pois o líder não está explorando diversas perspectivas com o liderado nem lhe dando a oportunidade de construírem juntos uma solução que beneficie ambos.
O líder inclusivo apresenta os fatos e problemas baseando-se em evidências. Então, ele conversa com seus liderados de forma honesta e respeitosa, para entender as perspectivas e compreensão do colaborador. Nesta condução, juntos, eles trabalham em alternativas que beneficiem a todos. O líder inclusivo reforça os sentimentos de responsabilidade, pertencimento e valorização do indivíduo.
Ser um líder inclusivo tampouco é tratar todos como iguais – afinal, cada um de nós tem suas diferenças, histórias, origens e características únicas que nos fizeram chegar aonde estamos. Não se trata de igualdade, mas de equidade.
Um líder inclusivo é capaz de reconhecer e entender o outro como ele é, sem julgamentos, filtros ou preconceitos. Ele possui ampla consciência de seus próprios vieses e busca ativamente por diferentes pontos de vista. Isso permite que a organização tome decisões com base em informações e construa soluções efetivas e inovadoras.
A liderança inclusiva também respeita competição e colaboração como partes importantes de um processo participativo, essenciais para alavancar resultados. O fato de o líder inclusivo valorizar a essência de cada indivíduo não significa que ele deixa os resultados da organização de lado.
Ao contrário, suas habilidades inclusivas permitem acessar ideias e pontos de vista que antes não eram trazidos pelos colaboradores por receio de críticas ou rechaço. Através de suas práticas de consultoria e estudos sobre inclusão nas organizações, a socióloga Mary-Francis Winters identificou que, quando os colaboradores se sentem seguros para usar a sua voz, a motivação e o engajamento em soluções e inovações aumentam exponencialmente.
Em minha atuação como consultora empresarial e mentora, eu percebo que a dificuldade das organizações de aplicar uma abordagem inclusiva é dada pelo modelo mental de seus líderes. Na maioria delas, os líderes atuam 90% ou mais do seu tempo com a mentalidade de liderança tradicional. Em outras palavras, chefes dão ordens ou direcionamentos e seus subordinados apenas seguem. E, na maioria das vezes, sem questionar. Esta postura mina o pensamento crítico e o questionamento apreciativo, essenciais para que a empresa inove, busque soluções e se mantenha competitiva no mercado em que atua.
A boa notícia é que a liderança inclusiva pode ser apreendida e suas disciplinas podem ser desenvolvidas pelos líderes e organizações. Porém, este é um processo que demanda esforço, comprometimento e disciplina dos líderes. Alina Polonskaia e Andrés Tapia, em seu livro The Five Disciplines of Inclusive Leaders, propõem um modelo de desenvolvimento composto por 5 traços e 5 competências essenciais de um líder inclusivo.
Os cinco traços de um líder inclusivo têm a ver com sua essência, valores e senso de propósito. Já as competências consistem na coordenação de conhecimentos, atitudes e habilidades que criam a aptidão que um líder possui para executar uma tarefa ou função.
Traços do líder inclusivo
1. Autenticidade para deixar de lado o ego e gerar confiança, mesmo em situações em que as pessoas tenham valores ou opiniões divergentes daquelas defendidas pelo líder.2. Curiosidade para perguntar sem julgar, de maneira empática e apreciativa.3. Autoconfiança em suas capacidades como líder, gerando uma postura otimista que contribui para um ambiente de trabalho saudável.4. Resiliência emocional para manter-se estável mesmo em situações de dificuldade, adversidades e polarizações.5. Flexibilidade para aceitar ambiguidade, mudanças e entender as necessidades de pessoas diferentes.
Competências do líder inclusivo
1. Estabelece laços de confiança através da honestidade e comunicação clara e efetiva.2. Integra diversas perspectivas, considerando pontos de vistas e necessidades diferentes ou até opostas. Navega bem em situações conflituosas.3. Otimiza seus talentos através da motivação, feedback e suporte que oferece para o crescimento dos colaboradores. Eleva a voz e presença dos colaboradores.4. Cria mentalidade e abordagem adaptáveis. Navega bem do macro ao específico, valorizando as particularidades.5. Promove transformações, desafiando corajosamente temas difíceis. Une esforços de pessoas com diferentes perspectivas.
Tornar-se mais inclusivo é uma jornada densa que não acontece da noite para o dia. É preciso treino e disciplina. Por isso, concluo este artigo com algumas sugestões de hábitos inclusivos simples, mas que transformarão a maneira como você lidera:
– Faça perguntas apreciativas durante suas reuniões com o seu time, em vez de dar respostas prontas.- Crie laços com pessoas diferentes de você, pessoas que não estão em sua área de atuação nem seguem a sua forma de trabalho ou as suas crenças.- Exponha-se ao diferente, mantendo o olhar de um aprendiz.- Preste atenção à linguagem! Nossa maneira de falar está influenciada por vieses inconscientes.- Trate os outros como eles gostariam de ser tratados, não como você gostaria de ser tratado.
Por fim, mas não menos importante, contagie outras pessoas no seu ambiente de trabalho para que pratiquem esses hábitos inclusivos. A liderança inclusiva é uma responsabilidade de todos nós.”