Uma análise crítica do novo documentário de Michael Moore, “Planeta dos Humanos”, contra a redução de vidas humanas para resolver a crise climática e a favor das fontes renováveis de energia
Segundo a estátua do político inglês Sir Winston Churchill, o passador de pano é aquele sujeito que alimenta um crocodilo na esperança de ser devorado por último. Lembrei-me deste adágio enquanto assistia o filme _Planeta dos Humanos_ produzido pelo cineasta e documentarista norte-americano Michael Moore. Moore é um autoproclamado ativista social e ambiental que, a meu ver, não está interessado em combater as causas das mudanças climáticas, mas apenas em aniquilar sua nêmesis, a sociedade de consumo ou, mais especificamente, o _American way of life_. O filme está disponível gratuitamente no YouTube desde o final de abril e teve mais de 8 milhões de visualizações até o momento.
Na verdade, o argumento central de _Planeta dos Humanos_ é correto: há uma emergência climática e, por consequência, há o risco de extinção da humanidade. Uma pletora de cientistas e especialistas entrevistados no documentário confirma o caráter antropocêntrico do aquecimento global. No entanto, eles falseiam – descaradamente, em minha opinião – dados e informações sobre a geração de energia por fontes renováveis. Assistindo às cenas deprimentes que se desenrolam (eu acrescentaria, ironicamente, com qualidade técnica de filminho do Tik-Tok), o pensamento que me veio à mente foi: caso os cientistas e especialistas do filme morassem no Brasil, o japonês da federal estaria batendo à porta de todos esses indivíduos, com mandado de prisão emitido por ministro do STF no âmbito do inquérito das fake news. Mas eu divago.
Vou discorrer sobre a explosão cambriana de falsidades expostas em _Planeta dos Humanos_, mas, antes, gostaria de alertar o leitor de que este artigo está repleto de spoilers. Vejo-os como um favor que vos faço para que não percas seu tempo precioso assistindo cem minutos de argumentos asininos contra a energia renovável. A tese central de _Planeta dos Humanos_ é a chamada solução Thanos, vilão da Marvel que com seis pedrinhas e uma luva de plástico dizimou metade da população da Terra num estalar de dedos. Segundo o documentário, nosso planeta está muito cheio de gente que consome muita energia que por sua vez emite muito gás de efeito estufa.
Francamente, não adianta passar pano para esse tipo de ativista. Não tem acordo para reduzir emissões de CO2; eles querem sangue. Duvida? No minuto 47 do documentário, um cientista declama em tradução livre: “Se não começar a morrer um monte de gente e rápido, não vai ter jeito…” enquanto o diretor e narrador Jeff Gibbs conclui com voz de sono: “Não é a molécula de dióxido de carbono que está destruindo o planeta. Quem está destruindo o planeta somos nozes”. (Uma liberdade poética-sarcástica desta tradução, é claro.)
Além das diatribes a favor da extinção parcial da humanidade, o que mais me incomoda no documentário é a mentira deslavada acerca do ciclo de vida das fontes renováveis de energia. O argumento prevalente no filme sugere que os processos industriais de manufatura de painéis solares e turbinas eólicas emitem tanto CO2 que no final das contas, melhor seria gerar eletricidade queimando combustíveis de origem fóssil. Mais de uma vez durante o filme, os tais especialistas-crocodilos falseiam números para tentar justificar a pretensa inviabilidade de combater o efeito estufa com energia renovável.
A literatura cientifica relevante está disponível para quem duvidar da viabilidade da energia renovável. A realidade incontroversa demonstra que uma unidade de energia de origem fóssil utilizada na fabricação de painéis solares e aerogeradores produz dezenas de unidades de energia elétrica e nenhuma emissão de CO2.
E a viabilidade da energia renovável está confirmada também na linguagem que todos entendem: dinheiro. Segundo relatório recém publicado pela Irena, agência internacional para a energia renovável, os preços de energia solar e eólica caíram tanto nos últimos dez anos que hoje é mais barato gerar eletricidade a partir de fontes renováveis do que queimar carvão. Obviamente esses valores precisam ser revistos no ambiente econômico pós pandemia, mas o sinal inequívoco da competitividade da energia renovável significa que o jogo está virando.
Parafraseando a estátua de Sir Winston Churchill, vai ser com sangue, suor e lágrimas, mas aposto um caminhão de pelúcias do Baby Yoda que em 20 anos a humanidade estará queimando pouco combustível fóssil, consumindo majoritariamente eletricidade fornecida por baterias, alimentadas por energia eólica e solar e, na base de todo o sistema elétrico, energia nuclear. Não vem que não tem, crocodilo. Não existe registro de fatalidades em países de primeiro mundo diretamente atribuídas à energia nuclear causadas pela chamada Síndrome Aguda da Radiação. Zero, zilch, nada, bupkis!