Quando gestores se sentem inseguros sobre seu status na organização, são grandes as chances de sabotarem as ideias inovadoras propostas por seus funcionários. Mas tem jeito: estudo mostra que é possível fazer com que eles se identifiquem mais com a empresa e com o espírito coletivo e, assim, mudar seu comportamento
Dilip está trabalhando arduamente na ideia de um novo produto que promete ser um divisor de águas na organização em que trabalha. Animado, ele vai conversar com o gestor esperando sua aprovação para continuar o desenvolvimento e fazer mais testes. Mas, quando compartilha o projeto, este é rejeitado na hora. Em vez de dar um feedback construtivo para viabilizar a ideia, o chefe fala vagamente de falta de orçamento e o desencoraja de seguir em frente.
Essa cena lhe parece familiar? Infelizmente, ela é bem comum em muitas empresas.
A criatividade e a inovação dos funcionários são cruciais para o sucesso das organizações. No entanto, quando eles têm ideias arrojadas, muitas vezes não recebem incentivo nem veem esses projetos saírem do papel. Seus gestores contribuem significativamente para esse fenômeno; mesmo quando dizem valorizar a criatividade, no dia a dia rejeitam as ideias inovadoras que lhes são propostas e impedem a sua implementação. Mas o que está por trás do “não” ao que poderia beneficiar a empresa – e a eles mesmos?
Até aqui, pesquisadores têm se concentrado em fatores de personalidade dos gestores, na abordagem econômica adotada por muitos deles ou em sua aversão generalizada à incerteza para explicar esse sufocamento das ideias dos funcionários. Um estudo sugeriu, por exemplo, que o foco dos gestores nas consequências financeiras de suas decisões os leva a rejeitar ideias inovadoras cujos resultados não podem ser previstos de maneira confiável.
No entanto, como discutimos em nosso artigo na revista Organization Science, existem razões mais profundas para essa rejeição, enraizadas em interesses próprios dos gestores ou em medos e inseguranças que estão encobertos.
Gestores costumam ascender a essa posição ao aprimorar sua expertise e ter sucesso em domínios específicos de tarefas. Eles podem ter desbravado ideias novas que foram bem-sucedidas e contribuíram para sua reputação profissional. Como resultado, é natural que sintam um senso de posse e apego a esses domínios e os vejam como seus próprios territórios. Afinal, identificar-se com um domínio – seja um campo de expertise ou uma área de responsabilidade – é crucial dentro das organizações, pois confere aos profissionais acesso a recursos, autoridade na tomada de decisão e a palavra final em conflitos relacionados a esse território.
Quem é o gestor territorialista?
Tem um cargo intermediário.
Seu status social na organização é baixo.
Não é admirado ou respeitado pelos colegas.
Sente-se inseguro e, por isso, inibe a inovação alheia.
No entanto, esse forte apego ao próprio domínio também pode se refletir em comportamentos territorialistas. Quando um colaborador propõe ideias para novos produtos ou processos com potencial para mudar o status quo, isso pode desencadear sentimentos de insegurança naquele gestor que teme perder o controle ou ser ofuscado por seus subordinados. E pode levá-lo a agir de modo territorialista e defensivo para proteger o que ele acha que lhe pertence por direito.
Mas não são todos os gestores que respondem defensivamente, no estilo “não mexa no meu queijo”. Nossa pesquisa indica que os gestores intermediários, com baixo status social informal no trabalho, são particularmente suscetíveis a essas inseguranças. Em geral, não são muito respeitados ou admirados por seus pares (o que é possível medir pedindo que avaliem o grau de respeito e admiração que sentem em relação a outros gestores).
Isso destaca a importância de reconhecer como esses gestores intermediários percebem seu status no local de trabalho, dado que nosso estudo sugere que existem implicações significativas e benefícios associados à compreensão de suas experiências.
Para promover mudanças em uma organização, os gestores precisam tanto de autoridade formal como de influência informal.
A autoridade formal é concedida por meio do cargo e da posição no organograma, o que lhes dá o poder de tomar decisões em um domínio específico, como alocar recursos, definir papéis e delegar tarefas aos membros da equipe. No entanto, a menos que também tenham uma influência informal, atribuída a eles por seu status social, encontrarão dificuldades para fazer mudanças em um nível organizacional mais amplo.
O status social dentro da organização é definido pela forma como as pessoas são percebidas e o quanto são respeitadas e admiradas por seus pares. Podem afetar o status fatores como desempenho, comportamento sociável e visibilidade de seus sucessos ou fracassos, assim como fatores fora do controle delas, como cultura organizacional, política, discriminação e vieses.
Independentemente do motivo, como o status serve de indicador do valor social de alguém no ambiente de trabalho, ele está profundamente ligado à autoestima dos indivíduos, molda sua percepção da dinâmica do meio e influencia suas interações com os outros.
Por isso, gestores com níveis menores de status social ou de respeito de seus pares se tornam altamente sensíveis ao que percebem como invasões do que consideram seu território e temem as ideias inovadoras de funcionários que potencialmente adentrem seu domínio. Tal apreensão incita um comportamento territorialista, que muitas vezes leva à retirada do apoio às ideias e dos recursos necessários como uma forma de impedir o avanço delas.
O estudo mostrou que os gestores de baixo status eram menos propensos a endossar a ideia de um funcionário quando ela era realmente inovadora (conforme a avaliação dos especialistas no assunto). Reproduzimos esse resultado usando diferentes desenhos experimentais, que ajudaram a estabelecer a relação entre causa e efeito: o baixo status de um gestor leva à territorialidade e ao menor endosso de ideias inovadoras.
Os resultados também revelam que é importante as empresas reconhecerem que o modo como os gestores se sentem tratados por seus pares pode ter repercussões importantes em suas decisões cotidianas como influenciadores-chave e guardiões do ecossistema de inovação da organização.
Quando se sentem valorizados e capacitados por seus pares, eles ficam mais inclinados a adotar um estilo de liderança mais aberto e inclusivo, que encoraja a experimentação, a tomada de riscos e a exploração de novas ideias. Isso, por sua vez, cria um espaço seguro para que os funcionários expressem suas ideias inovadoras, com a esperança de que sejam seriamente consideradas e até implementadas.
Por outro lado, se os gestores se sentem excluídos, desrespeitados ou hostilizados pelos pares, isso pode levar à insegurança e a sentimentos intensificados de ameaça. Essa dinâmica negativa sufoca a colaboração, impede o compartilhamento de conhecimento e desencoraja os funcionários a contribuir com insights criativos, inibindo a inovação em toda a organização.
Ao reconhecer a importância de entender como os gestores se sentem tratados por seus pares, as organizações podem tomar medidas proativas para promover um ambiente de trabalho solidário e colaborativo. Entre elas, criar programas de treinamento para melhorar as habilidades interpessoais, promover uma cultura de respeito mútuo e apreciação e dar recursos e apoio para ajudar os gestores a lidar com dinâmicas interpessoais desafiadoras.
Inovações de sucesso em geral não vêm de gênios solitários em momentos de ruptura, e sim como resultado de um processo social que envolve colaboração entre funcionários, colegas e gestores. Os gestores intermediários, em particular, desempenham o papel crucial de viabilizar a inovação ao identificar as ideias promissoras dos colaboradores e oferecer suporte para o seu desenvolvimento. No entanto, para muitos gestores é uma luta deixar de se ver como pessoas inovadoras e geradoras de ideias e abraçar seu papel como facilitadores dos esforços criativos de sua equipe. E a razão para isso é que muitos podem ter avançado na carreira demonstrando seu próprio pensamento inovador e suas habilidades de resolução de problemas.
Paradigmas tradicionais de liderança valorizam o sucesso e a inovação individuais, levando os gestores intermediários a acreditar que seu valor e sua identidade estão vinculados a sua capacidade de ter ideias inovadoras. Essa crença muitas vezes é reforçada por métricas de desempenho e critérios de avaliação que priorizam as contribuições individuais em detrimento da liderança facilitadora.
Outra crença comum entre gestores intermediários é a de que a adoção do papel de facilitador pode ser vista pelos outros como um sinal de fraqueza ou de incompetência.
Um gestor sênior de uma empresa consultada por nós disse: “Ser gestor era uma questão de alcançar metas sozinho, fechar negócios e coisas do tipo. Agora, o foco é apoiar minha equipe. Não me entenda mal: vê-los ter sucesso é muito gratificante, mas há uma parte de mim que sente falta da emoção daquela vitória pessoal e do sentimento de realização individual. Eu quase sinto que não sou mais visto como uma pessoa capaz de fazer isso”.
Resolver questões como essa requer um esforço conjunto da liderança para redefinir expectativas, oferecer treinamento e apoio adequados e criar uma cultura que valorize e recompense a inovação colaborativa.
Confira como os passos a seguir podem encorajar os gestores que se sentem vulneráveis a reconhecer o valor de promover as inovações de seus funcionários:
1 Reconheça os gestores por apoiar as ideias criativas dos times
Fomentar uma cultura de inovação requer mais do que apenas genialidade individual. Demanda uma liderança eficaz que nutra e dê poder à criatividade dos outros. Quando os gestores apoiam ativamente os membros de sua equipe e defendem suas ideias criativas, cultivam um ambiente colaborativo e inclusivo, no qual perspectivas diversas são valorizadas e soluções inovadoras florescem.
Reconhecer e recompensar esses gestores por seu apoio à criatividade dos funcionários envia uma mensagem poderosa: a de que a sua organização valoriza o trabalho em equipe e enxerga a importância de cultivar os seus talentos.
2 Incentive os gestores a priorizar o desenvolvimento e a implementação das ideias
Essa atitude não apenas promove uma abordagem mais sustentável para a inovação, mas também fortalece os laços entre os gestores e as suas equipes. Além disso, pode levar a um aumento do engajamento e da retenção de talentos.
3 Desloque o foco para a conquista coletiva
Ao mudar o foco da conquista individual para o apoio à criatividade de seus funcionários, a organização “alivia” as inseguranças do gestor de ser ultrapassado pelos subordinados. Ao ser encorajado a agir como mentor, facilitador e defensor das ideias do time, a tendência é a de que ele fique mais propenso a empoderar os outros em vez de competir com eles. Isso não apenas reduz o medo de ser ofuscado, mas também promove um sentimento de orgulho e de realização ao ver os integrantes da sua equipe fazendo sucesso e contribuindo de forma significativa para os objetivos do negócio.
Como combater o territorialismo
O que as organizações podem fazer para ajudar os gestores:
Promover uma cultura de inovação colaborativa em vez de incentivar o sucesso individual.
Criar treinamentos para melhorar habilidades interpessoais e resolver dinâmicas desafiadoras.
Incentivar a liderança a ser facilitadora das ideias de sua equipe.
Ajudar os gestores a criar uma identificação entre suas ações e os objetivos da empresa.
As organizações devem ajudar os gestores a entender como suas ações contribuem para os objetivos mais amplos do negócio e facilitar sua identificação com a empresa. Gestores que têm essa compreensão e identificação estão aptos a superar tendências territorialistas e a priorizar o bem coletivo sobre preocupações individuais, tornando-se mais favoráveis à inovação dos colaboradores no processo.
Em nossos estudos, descobrimos exatamente isto: gestores inseguros, que foram incentivados a pensar sobre seu vínculo mais amplo com a empresa e seus objetivos, reduziram significativamente o comportamento territorialista. Em um experimento de laboratório, demos a 330 participantes a tarefa de desempenhar o papel de líder de equipe em um cenário simulado, no qual manipulamos seu status social. Primeiro, estimulamos sua identificação organizacional, pedindo que refletissem sobre como é se identificar fortemente (ou não) com a empresa. Depois, mostramos a eles supostas respostas de outros participantes que reforçavam suas reflexões. Por fim, solicitamos que avaliassem sua disposição para apoiar e implementar uma ideia de produto inovador proposta por um colaborador de sua equipe. Os resultados mostraram que, para os participantes com alta identificação com a empresa, o impacto de ter baixo status foi reduzido na aprovação de ideias inovadoras.
Tomar medidas para melhorar a identificação organizacional não apenas facilita uma maior cooperação e o trabalho em equipe, mas também incentiva uma cultura mais inclusiva, na qual diferentes perspectivas e ideias inovadoras são valorizadas e apoiadas. Além disso, quando os gestores transcendem seus interesses pessoais e priorizam o sucesso da organização, dão um exemplo positivo para suas equipes e contribuem para criar uma cultura de confiança mútua, respeito e colaboração.
As organizações podem aprimorar ainda mais o vínculo dos gestores fornecendo oportunidades de desenvolvimento profissional e crescimento alinhadas aos objetivos estratégicos do negócio. Reconhecer e recompensar os gestores que demonstram compromisso com os objetivos da organização também reforça seu vínculo e incentiva uma cultura que valoriza a conquista coletiva.
O FENÔMENO DOS GESTORES TERRITORIALISTAS QUE SUFOCAM A INOVAÇÃO NAS ORGANIZAÇÕES É UM DESAFIO GENERALIZADO, o que requer análise cuidadosa e intervenções direcionadas. Nossa pesquisa lança luz sobre as dinâmicas ocultas que impulsionam esse comportamento, revelando como o baixo status social dos gestores pode levar a ações territorialistas defensivas que prejudicam a implementação de ideias inovadoras. Ao reconhecer a importância do status social dos gestores e promover um ambiente solidário entre colegas, as organizações podem empoderar esses gestores a adotar o papel de uma liderança facilitadora, nutrindo, assim, uma cultura de inovação colaborativa.
Além disso, ao enfatizar os objetivos mais amplos da empresa e facilitar a identificação dos gestores com a organização, os empregadores podem promover uma mudança de mentalidade da conquista individual para o sucesso coletivo. Em última análise, enfrentar os desafios apresentados pelos gestores territoriais requer uma abordagem multifacetada que priorize a colaboração, a inclusão e o vínculo organizacional.
Principais takeaways
Já é sabido: gestores que se sentem valorizados pelos pares são mais inclinados a ter um estilo de liderança inclusivo e a encorajar a experimentação e a inovação.
Então, para promover a inovação, é preciso promover um ambiente de trabalho verdadeiramente colaborativo. Isso se faz com treinamento em habilidades interpessoais e em dinâmicas interpessoais desafiadoras. Vale a pena reposicionar os gestores também como facilitadores de boas ideias.
Além disso, os gestores podem criar um vínculo maior com a organização se enxergarem as oportunidades de crescimento que têm alinhadas aos objetivos estratégicos.