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AUTOGESTÃO 16 min de leitura

Por que parece que nunca temos tempo suficiente?

Mais do que ajustar cronogramas ou evitar distrações, descubra como quebrar o ciclo da sobrecarga e gerenciar o recurso mais escasso de executivos e organizações, com três estratégias e quatro aceleradores

Charles Betito
Charles Betito
Por que parece que nunca temos tempo suficiente?
Este conteúdo pertence à editoria Transformação comportamental Ver mais conteúdos
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Lucas é gerente de projetos em uma startup promissora. Seu dia começa antes mesmo de o sol nascer, com e-mails pendentes e mensagens que exigem respostas urgentes. Durante as reuniões matinais, ele tenta se concentrar em alinhamentos estratégicos, mas sua mente está dividida entre aquele e-mail atravessado que recebeu de um cliente, o follow-up da reunião que acabou de sair e não conseguiu anotar, e a preocupação com a planilha de custos que precisa entregar até o final do dia.

\O almoço, momento em que poderia conversar com os colegas e saber o que está acontecendo nas outras áreas, é constantemente interrompido por ligações urgentes e mensagens de WhatsApp. Quando termina de comer, Lucas percebe, espantado, que nem se lembra do que estava no prato. 

Trabalhar além do horário se tornou norma em sua rotina, e, apesar de toda essa correria, ele nunca consegue terminar o que precisava no seu dia, acumulando mais tarefas para o dia seguinte. Apesar de todo o esforço, ele sente que nunca consegue terminar tudo o que deveria.

Lucas não está sozinho. De acordo com uma pesquisa conduzida pela McKinsey, 60% dos profissionais relatam que o excesso de tarefas administrativas e reuniões improdutivas consome grande parte do tempo que deveria ser dedicado a atividades estratégicas. Esse problema não é apenas uma questão de sobrecarga: ele reflete uma lacuna significativa na forma como organizamos e priorizamos nosso tempo.

Não se trata apenas de trabalhar mais ou ser mais disciplinado. A verdadeira questão está em como o tempo é percebido, distribuído e utilizado. Por que tantos profissionais sentem que nunca há tempo suficiente, mesmo em um mundo com tecnologias que prometem otimizar cada minuto? Como essa dinâmica impacta a produtividade, o bem-estar e até mesmo a inovação nas organizações?

Um recurso escasso e essencial

O tempo é a única constante verdadeiramente não renovável, e sua má gestão impacta diretamente a produtividade, a inovação e o bem-estar. Um levantamento conduzido pela Bain & Company, uma das principais consultorias globais, revelou que altos executivos gastam até 60% de seu tempo em reuniões e 20% em atividades rotineiras, sobrando apenas 20% para tarefas estratégicas. O estudo destacou ainda que mais de dois dias por semana são dedicados a reuniões com três ou mais pessoas, consumindo até 15% do tempo coletivo de uma organização.

Outro aspecto essencial está na correlação entre gestão do tempo e bem-estar. Subestimamos consistentemente o impacto do tempo mal gerido na nossa eficiência e qualidade de vida. Entender onde cada minuto é empregado é o primeiro passo para recuperar o controle. Esse ponto é reforçado no estudo “Time Smart: How to Reclaim Your Time and Live a Happier Life”, conduzido por Ashley Whillans, professora assistente da Harvard Business School e especialista em psicologia do tempo, que revela que priorizar atividades que economizam tempo, em vez de focar apenas em ganhos financeiros, resulta em maior satisfação e qualidade de vida. Isso inclui delegar tarefas, eliminar compromissos desnecessários e optar por soluções que economizem tempo em vez de apenas dinheiro.

A relação entre tempo e atenção

No premiado livro Rápido e Devagar, Daniel Kahneman explica que a mente humana possui limites claros para foco e energia mental. Essa realidade foi exacerbada pelo impacto crescente da tecnologia no ambiente de trabalho ao longo das décadas. Nos anos 1980, por exemplo, o trabalho era caracterizado por interações mais lineares e ferramentas analógicas, como telefonemas e memorandos em papel. Embora o ritmo fosse mais lento, as interrupções também eram menos frequentes.

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Com o advento da internet nos anos 1990 e o crescimento exponencial de ferramentas digitais nos anos 2000, como e-mails e mensageiros instantâneos, a promessa de produtividade deu lugar a uma sobrecarga de informação. Atualmente, plataformas de reuniões virtuais, redes sociais e aplicativos como WhatsApp contribuem para uma avalanche de solicitações que competem pela atenção. Isso é evidenciado no estudo “The Cost of Interrupted Work: More Speed and Stress” da Universidade da Califórnia, que mostrou que o trabalhador médio é interrompido aproximadamente a cada 11 minutos. Já Gloria Mark, professora de informática na Universidade de Irvine, liderou a pesquisa “Interruption Recovery in Distributed Work”, que concluiu que pode levar até 23 minutos para recuperar esse foco perdido após as interrupções.

Esse aumento de interrupções não se limita à quantidade de informações recebidas, mas à dispersão causada pelas ferramentas projetadas para “ajudar”. A contradição: em vez de libertar os profissionais, essas tecnologias muitas vezes aprisionam em ciclos de distração, reduzindo a capacidade de resolver problemas e aumentando os níveis de estresse. Isso só enfatiza a necessidade de criar ambientes que valorizem a atenção sustentada. 

Mais ainda, o impacto cumulativo dessas interrupções pode gerar o que especialistas chamam de “fadiga cognitiva”, reduzindo drasticamente a criatividade e a capacidade de resolver problemas complexos. Um exemplo claro está nos executivos que passam o dia pulando de uma reunião para outra, muitas vezes sem tempo para processar as informações recebidas ou refletir sobre as estratégias discutidas. Essa constante troca de contextos não apenas sobrecarrega o cérebro, mas também abre espaço para o estresse crônico, um dos principais gatilhos do burnout. 

Competindo por foco no ambiente corporativo

Organizações frequentemente competem por tempo e atenção – recursos escassos em qualquer cenário. No entanto, essa competição não precisa ser destrutiva. O conceito de “Equilíbrio de Nash”, oriundo da Teoria dos Jogos, propõe um modelo em que competidores podem coexistir e, ao mesmo tempo, colaborar para resultados mutuamente benéficos. Essa ideia foi expandida por Adam Brandenburger, estrategista, autor renomado e professor da NYU Stern School of Business, e Barry Nalebuff, economista, empreendedor e professor da Yale School of Management, conhecidos por seus trabalhos inovadores na Teoria dos Jogos com a introdução da cooperatividade, que incentiva competidores a unirem forças em busca de benefícios maiores, enquanto ainda preservam seus interesses individuais.

Um exemplo interessante pode ser visto na parceria entre Nvidia e Microsoft. Embora Nvidia lidere o setor de chips para inteligência artificial e Microsoft domine plataformas de software, ambas uniram forças para criar soluções integradas que impulsionam avanços em computação de alto desempenho. Essa colaboração foca no desenvolvimento de infraestruturas de IA mais acessíveis, permitindo que empresas de diversos tamanhos aproveitem essas tecnologias sem grandes barreiras de entrada. Esse tipo de sinergia demonstra que mesmo competidores podem encontrar terreno comum para alavancar a inovação, alocando recursos de maneira mais eficiente e maximizando o impacto para todo o ecossistema.

No entanto, essa abordagem não se limita ao setor de tecnologia. Organizações em diversas áreas podem adotar modelos de cooperatividade para melhorar o uso do tempo e da atenção de suas equipes, criando espaços onde a colaboração estratégica se torne um diferencial competitivo. Afinal, quando a sobrecarga de informações é constante, integrar esforços pode ser a solução para equilibrar produtividade e inovação.

Estratégias para atenção

Podemos destacar três estratégias para maximizar a atenção:

1. Reduzir reuniões improdutivas:

O artigo O surpreendente impacto dos dias sem reuniões publicado nesta MIT Sloan Management Review, revela que “dias sem reuniões” podem aumentar a produtividade em 25% e reduzir significativamente o desgaste mental. Medidas como definir agendas claras e limitar a participação a pessoas essenciais são cruciais. Além disso, é importante revisar regularmente a necessidade de reuniões recorrentes. Muitas vezes, compromissos regulares podem se tornar obsoletos, desperdiçando tempo valioso.

2. Adotar técnicas de foco sustentado

Metodologias como a “técnica Pomodoro” (que consiste em dividir o trabalho em blocos de tempo, geralmente de 25 minutos, intercalados com pequenas pausas) e o conceito de “deep work” (foca em criar condições para concentração profunda, eliminando distrações externas), promovido por Cal Newport, ajudam a preservar energia mental e aumentar a concentração. Ambos os métodos têm respaldo científico para otimizar o desempenho cognitivo.

Esses métodos ensinam algo mais profundo do que simplesmente focar, o que por si só já é óbvio. Eles ajudam a treinar a mente para identificar e largar as distrações de forma consciente. Por exemplo, nos 25 minutos de trabalho focado da Técnica Pomodoro, é essencial eliminar qualquer elemento que possa desviar sua atenção. Além disso, eles ensinam a importância das pausas entre blocos de atenção. Essas pausas não são apenas para descansar, mas para permitir que o cérebro opere em seu ritmo natural de ciclos de altos e baixos, melhorando o desempenho cognitivo. Afinal, o cérebro não é uma máquina que liga e desliga; ele precisa de pausas estratégicas para funcionar bem e evitar a exaustão mental. 

3. Aproveitar ferramentas tecnológicas

Plataformas como Asana e Trello permitem a automação de tarefas e a priorização de atividades, liberando tempo para trabalhos de maior impacto. Além disso, aplicações como RescueTime podem ajudar a monitorar o uso do tempo, fornecendo insights valiosos sobre onde ele está sendo gasto. No entanto, vale o aviso: de nada adianta a ferramenta se você não desenvolveu o processo ou a disciplina de uso. Esse é um dos grandes desafios e também erros cometidos por empresas que passam por transformações digitais.

Tempo e inovação: uma relação inseparável

As melhores ideias surgem em momentos de reflexão descompromissada, e não sob pressão. Isso é reforçado pelo artigo Make Time for the Work that Matters, publicado pela Harvard Business Review, da autoria de Julian Birkinshaw, professor de estratégia e empreendedorismo na London Business School e membro do conselho editorial de MIT SMR, no qual o profissional recomenda reservar “tempo sem agenda” para fomentar a criatividade. 

Esses momentos de descanso mental estimulam o “modo default” (rede de modo padrão – default mode network) do cérebro, uma rede neural associada à criatividade e à resolução de problemas complexos. Mas esqueça dos famosos – e impopulares – espaços para reflexão, como “salas de descompressão”. As organizações frequentemente não conseguem extrair o potencial completo desses ambientes porque, em geral, essas salas permanecem vazias, não por falta de necessidade, mas porque a cultura organizacional muitas vezes desincentiva seu uso. Colaboradores que utilizam esses espaços podem ser vistos como improdutivos ou julgados negativamente, o que desencoraja sua adoção. Portanto, não é a sala em si que gera resultados, mas a cultura da empresa que precisa mudar para normalizar pausas como parte integrante de um ambiente produtivo e saudável. 

Para que essas iniciativas tenham impacto real, é necessário que a liderança promova e modele comportamentos que incentivem a utilização desses espaços sem julgamentos, criando uma cultura que valorize o equilíbrio entre trabalho e recuperação mental.

Como as organizações podem implementar essas ideias

Existem o que podemos chamar de “aceleradores“, capazes de nos ajudar a implementar as ideias descritas neste artigo. Separamos alguns exemplos:

Mapeamento inicial: utilize ferramentas como o “Time Tracker” para identificar como o tempo é alocado, mas com um enfoque no benefício ao colaborador. É importante que isso não seja visto como um controle imposto pela empresa, mas como uma ferramenta para ajudar o profissional a melhorar sua própria gestão de tempo. Quando o foco está no colaborador, ele pode usar essas informações para reorganizar seu dia de maneira mais eficiente, priorizando tarefas estratégicas e equilibrando pausas necessárias. Empresas que adotam esse método com uma abordagem de suporte, em vez de supervisão, criam um ambiente de confiança e autonomia, essencial para o engajamento e a produtividade sustentável.

Políticas de foco: crie espaços livres de interrupções, mas repense também a ergonomia cognitiva do ambiente de trabalho. Durante muito tempo, acreditava-se que espaços abertos eram ideais para incentivar interações e aproximar equipes. No entanto, estudos, como o levantamento “The Cost of Interrupted Work: More Speed and Stress”, conduzido pela Universidade da Califórnia, mostram que esses ambientes também geram muitas interrupções, prejudicando o foco e a produtividade. É necessário um equilíbrio: projetar espaços que promovam conversas e relacionamentos internos, mas que também ofereçam áreas específicas para concentração e trabalho profundo. 

Capacitação: ofereça treinamentos que ensinam a gerenciar melhor a atenção antes de abordar a gestão do tempo. Ensinar os colaboradores a identificar e minimizar distrações, além de manter o foco em tarefas específicas, é essencial para construir uma base sólida. Somente após dominar o gerenciamento da atenção, é possível avançar para a gestão do tempo, que envolve o uso de ferramentas e organização pessoal. Essa abordagem em etapas ajuda a criar hábitos mais duradouros e eficazes no ambiente de trabalho.

Estabelecer regras claras e práticas: estabeleça regras, rituais e responsabilidades claras para a gestão da atenção. Em vez de apenas dar autonomia, é essencial criar um ambiente que incentive os colaboradores a entender como preservar a energia mental, tanto para si mesmos quanto para ajudar os outros. O local de trabalho do futuro será aquele em que as pessoas saberão lidar com o gasto de energia mental nas atividades do dia a dia, equilibrando foco, produtividade e bem-estar.

ATÉ POUCO TEMPO ATRÁS, pensava-se que a gestão do tempo era o principal atributo das pessoas mais produtivas. No entanto, os tempos mudaram, e hoje sabemos que gerir a atenção é ainda mais vital. A atenção bem treinada e gerida é a base para uma produtividade significativa e para o equilíbrio mental, permitindo que as pessoas lidem melhor com as demandas crescentes do dia a dia.

A criação de culturas corporativas que valorizem a atenção e o uso consciente da energia mental não é apenas desejável, mas urgente. O futuro do trabalho pertence às organizações que compreendem que gerenciar a atenção é a chave para alcançar não só melhores resultados, mas também um bem-estar duradouro para seus colaboradores. É hora de repensar práticas, espaços e comportamentos para construir ambientes que sejam verdadeiramente sustentáveis, tanto para as pessoas quanto para os negócios.

Charles Betito
Charles Betito
Charles Betito é especialista em saúde mental e educação nas empresas, com uma trajetória que combina abordagens de inovação, tecnologia e gestão de pessoas.

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