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Tecnologia e inovação

8 min de leitura

Web3: sua essência não é só tecnologia

A web3 também pode ser uma empresa, um produto ou um serviço. Ainda pode ser viabilizada por blockchain através da automatização de negócios via smart contracts, do controle da identidade pelos usuários e da prova da propriedade e alinhamento de incentivos via tokenização

Colunista Tatiana Revoredo

Tatiana Revoredo

26 de Outubro

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Artigo Web3: sua essência não é só tecnologia

No artigo de hoje, veremos por que a web3 não é apenas tecnologia, o que é uma empresa, um produto ou um serviço web3 e como blockchain viabiliza a web3 através da automatização de transações, do controle da identidade pelos usuários, da prova da propriedade e alinhamento de incentivos via tokenização.

A essência da Web3 não é apenas tecnologia

O próximo estágio de evolução da internet não é apenas tecnologia, mas uma nova maneira de usar a tecnologia para conectar e compartilhar informações e dados online.

A web3 possibilita aos usuários muito mais que apenas ler e escrever informações. Ela introduz o conceito de propriedade.

O principal objetivo da web3 é colocar o ser humano no centro de tudo, permitindo que as pessoas sejam proprietárias das informações que criam e com as quais interagem online – tendo mais controle sobre nossos dados, escolhendo como e onde eles serão compartilhados.

Mas, como?

Através de identidade auto-soberana, da prova de propriedade e da transferência de poder dos walled gardens – aplicativos que atualmente mantêm nossos dados cativos em silos – para o ser humano.

Com a identidade auto-soberana, nos identificamos online sem revelar mais dados do que o necessário para concluir uma operação ou transação.

Com a prova de propriedade via tecnologia blockchain que atribui a propriedade de um ativo diretamente a você, sem a necessidade de um validador tradicional de confiança. Isto é, com essa prova de propriedade, é possível mover livremente um ativo entre vários aplicativos, sem a necessidade da aprovação de um intermediário.

Por fim, com a transferência de poder dos walled gardens para as pessoas, possibilitada pela junção da identidade auto-soberana com a prova de propriedade via blockchain.

Agora que já entendemos que a essência da web3 não é só tecnologia, vamos compreender o que é uma empresa, um produto ou um serviço web3.

Empresas web3

É muito comum vermos empresas se posicionando como empresas web3 para atrair mais clientes e consumidores. Mas será que todas essas empresas são de fato empresas web3?

Todas as empresas em que a parte mais significativa de sua operação viabiliza o essencial da web3 podem ser consideradas uma empresa com foco no próximo estágio da web.

Um serviço ou produto que faz uso de identidade digital descentralizada pode ser considerado um serviço ou produto web3.

Também, um serviço ou produto que possibilite que as pessoas interajam diretamente de forma descentralizada é um produto ou serviço web3.

Assim, toda empresa cuja parte mais significativa de sua operação viabiliza os produtos e serviços acima mencionados é uma empresa web3.

Por outro lado, um serviço ou um produto que exige um KYC exaustivo, um serviço ou um produto que exija a validação de um operador centralizado, bem como todas as empresas em que a parte mais significativa de sua operação depende de um KYC exaustivo ou a validação de um operador centralizado não possuem a essência da web3 e, portanto, podem ser considerados como tal.

Agora que você já sabe o que é e o que não é uma empresa, um produto e um serviço web3, vamos compreender alguns institutos essenciais ao seu desenvolvimento.

Blockchain, contratos inteligentes, identidade auto-soberana e tokenização no desenvolvimento da web3

Blockchain é uma tecnologia de núcleo que permite o desenvolvimento da web3. Diferentemente dos bancos de dados tradicionais gerenciados por uma entidade central, blockchains são redes distribuídas em que todos os participantes têm uma cópia do mesmo registro.

Tal reduz a necessidade de terceirizar a “fonte da verdade” para um validador tradicional de confiança – o que é um dos pilares da web3. Como blockchain viabiliza a web3? Através da automatização de transações, do controle da identidade pelos usuários, da prova da propriedade e alinhamento de incentivos via tokenização.

Automatização de obrigações, transações e negócios

Contratos inteligentes automatizam cumprimento de obrigações e acordos e, se executados em blockchains, são invioláveis, transparentes, de aplicação precisa e sem intermediários.

Um contrato inteligente é um programa de computador auto executável capaz de aplicar automaticamente os termos de um acordo entre as partes. Essencialmente, é um contrato digital que contém um conjunto de regras e condições codificadas em um blockchain.

Os contratos inteligentes são projetados para automatizar a execução de transações e eliminar a necessidade de intermediários, como advogados, bancos e outros terceiros. Eles podem ser usados para facilitar uma ampla gama de transações, inclusive a transferência de ativos, a troca de moedas, a emissão de títulos e a execução de derivativos financeiros complexos.

Os contratos inteligentes funcionam usando uma série de instruções "se-então". Quando determinadas condições são atendidas, o contrato inteligente executa automaticamente a ação correspondente, como a transferência de fundos ou a liberação de ativos. Como os contratos inteligentes são executados no blockchain, eles são invioláveis, transparentes e imutáveis, garantindo que os termos do contrato sejam aplicados com precisão.

Controle de identidade pelos usuários

A identidade descentralizada (IDD), também chamada de identidade auto-soberana, é um conceito emergente da web3 baseado em uma estrutura de confiança para a gestão da identidade. E é a tecnologia blockchain que possibilita a criação de identidades digitais descentralizadas (auto-soberanas), permitindo seu controle pelas pessoas.

Provar que existimos normalmente é necessário para que os cidadãos tenham acesso a serviços essenciais como saúde, bancos e educação.

No entanto, uma parte considerável da população está em uma posição precária, incapaz de votar, abrir uma conta bancária, possuir propriedade ou encontrar um emprego. A impossibilidade de obter documentos de identificação limita a liberdade das pessoas.

Por outro lado, os sistemas tradicionais de identificação “centralizada”, além de dependerem da eficiência dos governos em identificar todos os seus cidadãos, são inseguros, fragmentados e excludentes.

Os bancos de dados de identidade centralizados estão em risco, pois muitas vezes se tornam alvos privilegiados para os hackers. De tempos em tempos, ouvimos falar de hackeamentos e ataques a soluções de identidade centralizadas, nas quais milhares e milhões de registros de clientes estão sendo “furtados” dos principais varejistas.

Neste contexto, uma prova criptográfica de identidade em blockchain resolve grande parte das questões que acabamos de ver nos parágrafos anteriores, proporcionando uma forma de utilizar a identidade digital em múltiplas plataformas participantes sem sacrificar a segurança e a experiência do usuário.

Ao fornecer uma arquitetura consistente, interoperável e à prova de adulterações, as blockchains permitem o gerenciamento e armazenamento seguro de dados e propriedade intelectual, com vantagens significativos para organizações, usuários, desenvolvedores e sistemas de gerenciamento da Internet das Coisas (IoT).

Há quem diga que não é necessário blockchain para se ter uma identidade digital descentralizada, mas a verdade é que até hoje, foi a tecnologia blockchain que se mostrou mais viável para resolver todos os problemas que acabamos de discorrer.

Na web3, alguns serviços podem até exigir a validação de terceiros para que um indivíduo possa acessá-los e usá-los. Por exemplo, uma certidão de nascimento ou carteira de motorista pode ser necessária para obter acesso.

Mas diferentemente de um processo centralizado na web2 – onde o governo emite e gerencia a identidade de um indivíduo, emitindo um atestado para sua carteira de motorista ou outro documento de identificação – na web3, a prova criptográfica da identidade de uma pessoa está vinculado a um de seus endereços públicos na blockchain, o que garante ao indivíduo o controle sobre sua identidade e, ao mesmo tempo, o acesso a serviços que antes exigiriam a verificação de terceiros.

Prova da propriedade e alinhamento de incentivos via tokenização

O conceito de tokenização precede a tecnologia blockchain, e era projetada principalmente para proteger dados confidenciais.

Com o surgimento da tecnologia blockchain, contudo, a tokenização de ativos passou a ser habilitada com mais flexibilidade, ampliando significativamente as possíveis aplicações de tokens digitais em uma ampla gama de setores.

Os tokens são representações de um determinado ativo ou utilidade. No contexto da tecnologia blockchain, a tokenização é o processo de conversão de algo de valor em um token digital que pode ser usado em um aplicativo blockchain. Praticamente qualquer coisa pode ser tokenizada se for considerada um ativo que possa ser possuído e tenha valor para alguém, mas os mais comuns estão resumidos abaixo:

  • Tokens de ativos físicos: representações digitais de ativos tangíveis (por exemplo, ouro, imóveis, arte) criados e mantidos em uma blockchain.
  • Tokens de ativos intangíveis: qualquer ativo intangível tradicional (por exemplo, royalties, pontos de fidelidade, licenciamento de conteúdo).
  • Tokens de utilidade: emitidos por criadores individuais ou comunidades que permitem que os membros da comunidade desbloqueiem conteúdo ou experiências exclusivas ou tenham participação no trabalho do criador. (por exemplo, tokens sociais)
  • Tokens de governança: representam propriedade e, muitas vezes, direitos de voto em um protocolo descentralizado.
  • Os tokens não fungíveis (NFTs): ativos digitais exclusivos que são verificados em um blockchain, fornecendo prova de propriedade e escassez.

Pois bem, além de viabilizar a transferência da prova da propriedade dos ativos para blockchain, a tokenização também alinha incentivos na web3. O que quero dizer com isso?

Quando uma rede é de propriedade de uma empresa privada e centralizada como é a regra na web2, o valor econômico acaba fluindo para longe dos participantes da rede e em direção a um grupo de acionistas, detentores de ações na corporação, mas que em sua maioria, não participaram da construção da rede.

Já em uma rede descentralizada – onde não existe uma única entidade responsável pelo controle dessa rede –, a mesma dinâmica não se aplica.

Blockchains públicas, de código aberto e tokenizadas resolvem o problema do alinhamento de incentivos entre fundadores e participantes da rede, quando projetadas adequadamente.

Quando a blockchain é pública, e a organização fundadora da rede é uma entidade sem fins lucrativos, o “imperativo de extração” é eliminado – porque literalmente não há acionistas com uma reivindicação de fluxo de caixa.

O “valor” é mantido na própria rede, representado na forma de tokens. Todos que participam da atividade da rede, usando e acumulando tokens no processo, tornam-se efetivamente “proprietários” da rede. Como não há distinção entre proprietários e participantes, há um desalinhamento de incentivos.

Mas e você? Compreendeu a essência da web3? Sabia o que era um produto ou serviço com foco no novo estágio da web? Tinha ideia de que a tecnologia blockchain viabiliza a web3 através da automatização de negócios via smart contracts, do controle da identidade pelos usuários e da prova da propriedade e alinhamento de incentivos via tokenização?

Conhecimento é poder!! Nos vemos em breve!

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Colunista Tatiana Revoredo

Tatiana Revoredo

Tatiana Revoredo é LinkedIn Top Voice em Tecnologia e Inovação. Especialista em aplicações de negócios Blockchain pelo MIT Sloan School of Management, em Inteligência Artificial pelo MIT CSAIL, em estratégia de negócios em Inteligência Artificial pelo MIT Sloan School of Management e em Cyber-Risk Mitigation pela Harvard University. Estrategista Blockchain pela Saïd Business School, University of Oxford. Professora do curso Blockchain para negócios no Insper. Autora de três livros “Blockchain- Tudo o Que Você Precisa Saber”, “Bitcoin, CBDC, Stablecoins e DeFi”, e “Cryptocurrencies in the International Scenario”.

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