As visões sobre tecnologias de autoatendimento podem ser substancialmente diferentes entre gestores do negócio e seus clientes
Para muitas empresas, a ideia de tecnologias self-service parece ser uma situação tipo ganha-ganha. Quiosques, websites, apps para celular e outras tecnologias permitem que serviços sejam automatizados, despesas sejam reduzidas e, potencialmente, aumentam a receita, ao mesmo tempo que oferecem maior controle do processo ao cliente. Entretanto, existem numerosos exemplos de sistemas que não trouxeram o retorno esperado. Por exemplo, a rede de mercearias Albertsons LLC, de Boise, Idaho, resolveu extinguir o auto check-out como uma forma de melhorar a experiência de compra de seus consumidores.
Os clientes estão fugindo do autosserviço? Não. Na verdade, é comum preferirem agir por conta própria em vez de serem atendidos por um funcionário. Por exemplo, locadoras de veículos como Alamo e Enterprise contam que terminais de autosserviço podem reduzir o tempo de check-in à metade, o que aumenta a satisfação do cliente com o processo de locação.
O que fica claro é que a clientela não quer perder a opção de autosserviço, mas ficar longe daquelas que funcionam mal. Sistemas mal implementados resultam em frustração ou são abandonados, assim como em perda de retorno ou de redução de custos.
O que nos traz a pergunta: os gestores realmente sabem o que o cliente espera do autoatendimento? Da perspectiva do gestor, a oferta desse modelo gera entusiasmo e traz, para aqueles que lidam bem com tecnologia, uma opção adicional e desejada. Por outro lado, podem não saber o que o cliente exige de um sistema como esse.
Para verificar se existem diferenças entre esses pontos de vista (gestores e clientes), conversamos com dois grupos sobre suas ideias sobre o que o cliente realmente deseja em uma situação de autosserviço: um grupo foi composto por gerentes de restaurantes que tinham recém-implantado um serviço automático que permite aos usuários fazerem seus próprios pedidos; o segundo grupo era formado por consumidores que usam essa tecnologia.
Os itens cobertos pela pesquisa mediam conceitos como a ansiedade gerada pela tecnologia, a necessidade de interação humana, conveniência, velocidade da transação, precisão percebida quanto ao pedido, satisfação e percepção de confiança.
Para pesquisa junto ao primeiro grupo, enviamos um convite para membros selecionados do Nation’s Restaurant News, uma publicação comercial conhecida. Um total de 204 pessoas respondeu, mas três dos respondentes forneceram respostas incompletas, o que provocou sua eliminação da amostra total, com 201 participantes ao final. Os resultados foram razoavelmente equilibrados entre restaurantes de rede (55%) e independentes (45%). Entre os independentes tivemos 55% de proprietários como respondentes, contra 23% de gerentes gerais. Entre os que eram parte de redes, 63% faziam parte de corporações com mais de cem unidades.
Em seguida, usamos uma base de dados norte-americana para chegar aos clientes que já haviam usado anteriormente esse sistema de pedidos e tivemos retorno de 254 pessoas, sendo 51% do sexo feminino e cerca de metade com idade entre 35 e 64 anos. A escala foi minimamente adaptada da primeira pesquisa, de forma a se poder comparar os resultados, sendo 1 igual a “discordo completamente” até 7 para “concordo plenamente”.
Analisamos os resultados usando uma modelagem estatística para ver se as diferenças de visão sobre os sistemas entre clientes e gerentes eram significativas. Começamos pela influência da ansiedade gerada pela tecnologia nas percepções de conveniência e necessidade de interação humana. A seguir, exploramos como a conveniência e interação influenciavam a velocidade da transação e a percepção de precisão.
Também examinamos quais combinações tinham maior influência nas avaliações de confiança e satisfação numa experiência de autosserviço. Encontramos contrastes importantes em três áreas: a necessidade dos clientes de interação humana, conveniência da tecnologia de autosserviço e a demanda por velocidade na transação.
Tecnologias self-service são, em geral, implantadas com a expectativa de que o cliente quer usá-las e irá (alegremente) explorá-las. No entanto, a realidade aponta que muitos desses clientes hesitam em usar um sistema novo, especialmente se este partir do modelo de atendimento pessoal. Os gestores subestimaram significativamente a necessidade de interagir com os funcionários do restaurante durante a experiência do autosserviço, particularmente quando o cliente demonstrou ansiedade.
Clientes querem uma rede de proteção para o caso de acontecer uma falha, como descobrimos, e querem explicitamente que uma pessoa esteja disponível. Essa ansiedade que alguns podem sentir ao usar uma tecnologia nova indica que o autoatendimento funciona melhor se tiver o apoio de pessoas nos primeiros usos, o que significa que, inicialmente, a economia de trabalho será menor. Uma vez que a ansiedade pelo uso da tecnologia diminui, a equipe de atendimento pode ser reduzida, com uma possível queda com custos de mão de obra ou realocação de pessoal.
Quando a tecnologia é usada em um espaço público, a demanda por pessoal cresce. Um varejista que faz um bom trabalho oferecendo a combinação entre sistemas de autosserviço e atendimento presencial é a loja de departamentos Bon-Ton. Vendedores dão apoio aos clientes, mas, se não encontrarem um determinado modelo ou tamanho, são encaminhados a um terminal no qual podem buscar opções em um estoque mais variado. Essa tecnologia facilita a vida não apenas do cliente como também do funcionário.
A segunda área que apresentou diferenças gritantes entre as visões de gerentes e clientes foi a importância que cada um dá à conveniência. Um motivo básico para o cliente escolher o autoatendimento é a crença de que terá maior conveniência, o que, em geral, quer dizer que o cliente escolhe como e quando realizar as interações.
Os clientes apontaram que a conveniência dessa tecnologia afetava significativamente a exatidão da transação; os gestores, por outro lado, avaliavam a conveniência como bem menos importante que a exatidão. A conveniência no uso da tecnologia, tanto virtual como presencial, tinha uma participação importante no conforto e na confiança do cliente.
Se os consumidores puderem escolher um lugar e hora mais adequados para usar um aplicativo em seus smartphones, essa experiência será menos dispersa e mais exata. Por exemplo, o sistema de pedidos online da Domino’s Pizza, com sede em Ann Arbor, Michigan, aumentou a qualidade e o número de pedidos ao deixar que seus usuários seguissem seu próprio ritmo ao pedirem. Assim, os clientes podem revisar e verificar o que vão comprar sem se sentirem pressionados por tempo, o que aumenta a precisão da escolha.
A disponibilização de totens e outros aparelhos dentro de uma loja afeta a conveniência, dizem os especialistas. Se forem postos em lugares de pouco acesso ou difíceis de achar, serão frequentemente ignorados pelos usuários, por uma percepção de inconveniência. Se a facilidade de usá-los for evidenciada, a tentativa e adoção se darão de forma muito mais rápida.
A terceira área em que gerentes e clientes apresentaram discordância foi quanto à velocidade da transação. Este foi o item que mais pontuou entre os clientes, enquanto os gestores o consideraram muito menos importante. Muitas das empresas com autosserviço bem-sucedido se voltaram para tornar tarefas simples mais rápidas.
Um exemplo é a instalação de totens para verificação de passaportes em diversos aeroportos pela U.S. Customs and Border Protection. Esses terminais foram um sucesso e reduziram muito o tempo de espera. Da mesma maneira, o Arizona Department of Transportation Motor Vehicle Division implantou terminais de renovação de documentos.
Porém, os gestores devem ensinar aos usuários o uso correto da tecnologia. O serviço dos Correios norte-americano implantou um totem para pesagem e pagamento pela postagem de encomendas, mas este terminal não recebe pacotes com mais de 35 quilos ou mala direta, o que nem sempre é notado logo de cara.
Da mesma forma, os mercados nem sempre informam com o devido destaque que o check-out automático é para “até 15 itens”, de forma que o cliente entenda que esta opção é para pequenas compras. A ênfase na rapidez também significa que a distribuição interna, espaço físico e posicionamento são essenciais para evitar gargalos de atendimento.
Geralmente as diferenças entre o que a clientela quer e o que acham que ela deseja do autoatendimento foram esclarecedoras. Os gerentes não viam a necessidade de atendimento pessoal (presencial ou virtual), subestimavam a importância da conveniência e subvalorizavam a rapidez na transação. Esses três componentes têm um tremendo impacto na implantação de tecnologia self-service e podem explicar a receptividade baixa que tiveram algumas tentativas. Os gestores precisam entender que, mesmo os consumidores habituados ao uso de sistemas, podem precisar de apoio de um funcionário ao começarem a usá-los. Uma vez que se acostumem, essa necessidade pode se reduzir.
Quando a gestão busca encontrar novas opções de atendimento a seus clientes ao mesmo tempo em que cortam custos, os aplicativos de autoatendimento são uma alternativa sedutora, desde que se saiba o que esses clientes esperam. No entanto, se a redução dos custos for o foco principal, deixando a experiência de lado, o autosserviço pode resultar somente em consumidores desencantados e uma tecnologia cara que ninguém quer usar.
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