
Podemos e devemos fazer amigos no ambiente de trabalho. Saiba como fazer isso de modo construtivo e — por que não? — intencional
É natural querer fazer amizades no trabalho – afinal, passamos um terço da vida adulta nesse ambiente. E, felizmente, não vivemos sob as regras da empresa do seriado “Ruptura”, a Lumen, que é fictícia, mas assustadoramente real. Nela, os funcionários têm suas memórias divididas entre vida pessoal e profissional, sem qualquer conexão entre esses dois mundos.
Claro que, além da motivação natural para construir vínculos de amizade, nos aproximamos dos outros no meio corporativo de modo intencional – e legítimo. As mais comuns são entender a cultura organizacional, aprender um processo e enxergar as opções de carreira lá dentro.
No entanto, sempre há quem encare as aproximações como interesseiras, adulatórias ou até conspiratórias. Devemos lidar com isso sempre agindo com a maior sinceridade possível. Só assim vamos gerar empatia e conquistar a confiança dos outros.
Esta sinceridade necessariamente inclui mostrar um pouco da nossa vulnerabilidade, coisa difícil em ambientes muito competitivos ou em empresas em crescimento acelerado, onde as pessoas têm pouco ou nenhum tempo para qualquer comunicação interpessoal que não seja absolutamente tática. Essa mesma falta de tempo ocorre em empresas cujos funcionários estão lutando pela própria sobrevivência, mas nestas é melhor procurar outro emprego!
Há quatro tipos de amizades que você pode criar no local de trabalho:
Esta é a amizade mais comum dentro da empresa. E todos nós tivemos treinamento prévio para ela, por exemplo, lidando com membros da família dos quais nos aproximamos pelo fato de serem família. Na empresa, pode ser um colega de trabalho que tem uma habilidade que você precisa adquirir ou um mentor, formal ou informal.
Mas, além da aquisição de habilidades específicas, pessoas são importantes para “traduzir” sutilezas culturais da empresa e fornecer “guarida política” quando você colide com alguma regra organizacional não escrita.
É fácil ser espontâneo aqui, mas quem se aproxima com espontaneidade demasiada pode encontrar resistência do outro lado, o que requer um tato adicional.
Esta é aquela amizade que se desenvolve com pares. Um exemplo clássico: você pede ajuda para um par no financeiro para solucionar um problema seu na logística e, feliz com o apoio, torna-se amigo dele.
Claro que é mais fácil e frequente construir esse vínculo com quem está mais próximo a você, seja na estrutura organizacional ou no espaço físico. Mas pode também pode ser alguém que simplesmente sentou na sua mesma no refeitório ou que entrou na empresa no dia em que você.
Nós brasileiros fazemos isso muito bem: nos relacionamos para os lados muito melhor que para cima e para baixo. Esse pode ser um tema espinhoso em outros países, e brasileiros expatriados invariavelmente se surpreendem com o fato de que esse tipo de vínculo seja tão mais raro no exterior.
Esta é a amizade menos comum de se desenvolver na empresa e, ao mesmo tempo, a que pode ser a fonte das melhores amizades a médio e longo prazo . Em geral, é um par. Pode ser alguém que pensa muito diferente de você e que ambos enxergam o valor de saber como funciona o mundo do outro. É possível também que seja alguém que você conheceu em um treinamento interno em um grupo da empresa dedicado a atividades “extracurriculares”: night bikers, culinária ou corridas.
Minha história favorita: uma empresa onde trabalhei tinha um campeonato para perder peso. Na realidade dois: um para casais e um individual, ambos com prazo de 180 dias. Na versão casais, o que menos emagrecia pagava o jantar do casal vencedor em um restaurante fino da escolha destes. Vinte anos depois, continuavam amigos além da empresa.
Este é o nirvana da amizade: aquelas pessoas que espontaneamente buscam e investem na amizade – primeiro pela afinidade, depois pelo afeto.
Embora raramente ocorra enquanto estamos trabalhando na mesma empresa, muitos de nós temos amigos muito queridos com quem trabalhamos há tempos em outra empresa. Este tipo de amizade é um item fundamental de sobrevivência existencial hoje em dia, no qual as extremas contradições do mundo moderno testam – e frequentemente esgarçam – todos os nossos relacionamentos.
Existe um teste psicométrico que mede como as pessoas convidam umas às outras para fazer parte de equipes de trabalho. Chama-se firo-b. Menciono aqui porque lida com um ângulo pouco explorado de como “afinidade” e “afeto” funcionam nas relações de trabalho. Observo no meu coaching que muitos clientes querem entender melhor como escolhem pessoas para trabalhar nas equipes que formam.
Para quem quiser se aprofundar no tema da construção de vínculos de amizade no trabalho, recomendo ler o trabalho espetacular de uma colega do Substack sobre os diversos tipos de amizade. Ela se baseou em um artigo acadêmico da filósofa norte-americana Marilyn Friedman. Ambas enxergam nove tipos de amizade, que eu tomei a liberdade de combinar e reduzir para quatro por considerar que alguns deles são improváveis no ambiente de trabalho.