Líderes precisam aplicar estratégias voltadas às pessoas com o mesmo empenho que pensam e executam estratégias de gestão; e não falo aqui das lideranças de RH e DE&I, mas sobre e para os líderes de negócios
““Se você quer construir um navio, não chame as pessoas para juntar madeira ou atribua-lhes tarefas e trabalho, mas ensine-os a desejar a infinita imensidão do oceano.” – Antoine de Saint-Exupery.
Difícil falar de tendências para o ano quando a gente não sabe o que vai acontecer na próxima semana. A incerteza do que vem a seguir, é um dos efeitos mais fortes da pandemia. Se programo a viagem de férias com a família, não sei se conseguiremos ir, mesmo com tudo já acertado, pois o voo pode ser cancelado a qualquer momento, as fronteiras podem fechar ou posso ter um resultado positivo de Covid-19 e, assim, ser impedida de embarcar. Enfim, apesar disso tudo, não podemos nos tornar prisioneiros do presente, pois é necessário pensar no que vem pela frente.
Em termos de DE&I (diversidade, equidade e inclusão), vimos um ano (2020) protagonizado pelos grupos diversos lutando para serem escutados. Em 2021, vimos empresas e marcas se mobilizando para representar a sociedade em suas campanhas, comprometidas com processos seletivos mais inclusivos, vagas afirmativas e muitas mensagens bonitas para mostrarem seu compromisso com a valorização da diversidade. Além disso, foi o ano onde explodiram as contratações de profissionais dedicados ao tema de DE&I e um “boom” de consultorias especializadas no tema.
Então o que podemos esperar para 2022? Muitas previsões falam de saúde mental, diversidade como protagonista de práticas ESG, interseccionalidade no centro das ações e colaboradores escolhendo onde querem trabalhar, inclusive expondo as empresas onde não há DE&I na prática.
Realmente acredito que isso que foi descrito acima vai acontecer – e de maneira muito intensa –, mas o que eu quero destacar neste artigo é a uma tendência que acredito ser a mais protagonista para esse ano: o papel da verdadeira liderança inclusiva.
Da visão que tenho a partir do ponto em que estou, assim como tivemos o protagonismo dos grupos diversos em 2020, das empresas e marcas em 2021, teremos líderes no centro das ações de DE&I em 2022. Não estou falando da liderança de recursos humanos, ou da liderança de DE&I, mas dos e das líderes de negócios.
Líderes são aquelas pessoas que determinam o tom na cultura organizacional, de como as pessoas são contratadas e recebem oportunidades de desenvolvimento e de como são classificadas ou não como talentos de alto potencial para a empresa. Ou seja, está nas mãos da liderança de cada equipe, fazer acontecer a inclusão no dia a dia).
No entanto, ao mesmo tempo, vejo esse grupo como o mais perdido dentro da estratégia de DE&I das organizações, entre as demandas dos grupos diversos e o que exige deles a empresa. Parte dessa liderança ainda não acordou para o tema como crucial para seu sucesso no papel de líder.
Essa parcela da liderança até participar dos treinamentos da empresa, mas depois não sabe o que fazer com seu time. Além disso, parte do grupo faz piadas sobre o conteúdo do treinamento ou quando o líder fala da importância do tema. Essa a liderança que entende o conceito, mas não tem a menor ideia de como colocá-lo em prática, acaba terceirizando para o time de RH (ou para uma única pessoa diversa do time) a responsabilidade pela execução da estratégia.
Patrocinar e fazer a abertura do evento da semana de diversidade da empresa, com discurso bonito e ensaiado, não necessariamente o habilita para ser um líder inclusivo. Não vou negar que esse é um dos passos da jornada, mas é importante lembrar que não é o percurso completo.
Em 2022, não vai bastar que o CEO faça cobranças sobre quem não foi ao evento de diversidade, mas sim que os inspire a fazer parte da transformação, fazendo-os sentir que isso também é um dos pilares que compõem o perfil de líder de sucesso dentro da sua empresa.
Como disse o neurocientista Donald Calne, a diferença entre emoção e razão é que a emoção leva à ação, enquanto a razão leva a conclusões. Quando a empresa está em um processo de transformação cultural, estamos mudando a maneira como as pessoas agem e interagem, suas emoções, e suas reações em relação a essa nova experiência.
Este ano irá fazer com que líderes tomem para si o desafio não só de desenhar seus planos de diversidade com a ajuda dos CDO (Chief Diversity Officer) e do RH, mas também de serem responsáveis em implementar e executar essa estratégia. Do mesmo jeito que há um plano definido sobre a estratégia de vendas para cada produto ou território e que, quem implementa e executa são os times de vendas, o mesmo deveria acontecer para os gestores sobre os temas de diversidade.
Simon Sinek diz que líder não é quem está no comando, mas quem cuida das pessoas que estão sob seu comando, por isso gestores e gestoras precisam executar estratégias de cuidado com as pessoas, assim como fazem com suas estratégias de negócios.
E não há como cuidar do seu time, sem liderar pelo exemplo. As pessoas seguem seus líderes e se comportam da maneira que eles se comportam, e não como eles dizem que se comportariam.
Vou compartilhar um exemplo bobo, mas que ilustra isso muito bem o tema. Na Oracle, empresa que trabalho, um dos líderes mais influentes lançou uma moda de usar sempre o mesmo tipo de sapato combinando com o mesmo tipo de calça. Um dia recebi uma foto de alguém que estava no elevador e, curiosamente, cinco pessoas estavam com o mesmo tipo de sapato e calça que esse líder.
Parece pequeno, mas fazer parte de um grupo é um dos instintos mais básicos do ser humano, e as pessoas o fazem muitas vezes sem perceber. Se a alta liderança da sua empresa ou o grupo de líderes mais influentes começarem a implementar e acompanhar resultados das ações de diversidade e inclusão dentro de seus próprios times, aumentará muito a possibilidade de outros times seguirem o mesmo comportamento.
Cada cultura exige uma postura dos seus líderes e por isso não vou listar aqui o que cada pessoa deveria fazer. Além disso, o checklist da liderança inclusiva de 2021 continua valendo. O que gostaria de deixar como mensagem final, é o que líderes que querem ser aliados do tema de DE&I, deveriam deixar de fazer. Vi recentemente um post da Pulsos Consultoria DE&I que falava sobre os perfis de aliados que não agregam em nada nas estratégias de diversidade. Aqui vão alguns deles:
Aliado caça-diploma: preocupa-se somente com o título de aliado. É aquela pessoa que mesmo consciente e concordando que DE&I é importante, não faz nada de concreto para mudar a situação.
Aliado algoritmo: se engaja em todas as campanhas nas mídias sociais, mas só quando todo mundo está postando. Tem medo de acharem que é militante demais.
Aliado vaca-amarela: vai nos eventos, curte os posts a favor da inclusão, mas não se manifesta nos grupos de amigos ou colegas de trabalho, quando acontece um comentário ou piada preconceituosa.
Aliado “complicadista”: representa a pessoa que acredita que as pautas são importantes, mas que vai ser muito difícil mudar as coisas. Quer contratar mais mulheres, mas reclama que não acha nenhuma candidata.
Aliado corporativo: aquele que espera que a empresa resolva as coisas por ele. Contrata a pessoa que vai liderar DE&I e depois cobra dela o miliagre da retenção de mulheres, mesmo sem nenhum plano de desenvolvimento de lideranças femininas.
Para finalizar a discussão deste artigo, deixo um último recado: não terceirize o seu plano de pessoas, assim como você não terceirizaria o seu plano de negócios.””