Payments 4.X, tecnologia baseada em sensores, visão computacional e deep learning juntam-se à disrupção causada pelo Pix e pelo open finance
Há uma revolução em curso no mercado de pagamentos – o avanço do Pix e do open finance são provas disso. Para dimensionar o impacto dessa transformação, uma pesquisa recente projetou o cenário para o uso do dinheiro em espécie. Descobriu que, até 2024, ele representará menos de 10% dos pagamentos em lojas nos Estados Unidos – e 13% daqueles em escala global. A informação é do estudo Payments Top Trends 2022, elaborado pelo Capgemini Research Institute.
“Cada vez mais os meios de pagamento não serão físicos, e sim pelo celular. Isso está diretamente relacionado ao crescimento do e-commerce e às soluções que surgem no varejo físico”, afirma Roberto Kanter, economista e professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Segundo ele, a digitalização do varejo tradicional está relacionada à tentativa de tornar a experiência de compra nas lojas de rua tão natural quanto no ambiente virtual.
A nova era dos pagamentos institui a fluidez nas experiências de compra. Assim sendo, os pagamentos passam a ser “invisíveis”, inseridos na dinâmica do dia a dia. É o início da era chamada de Payments 4.X, uma tendência que já é realidade nas lojas Amazon Go e Amazon Fresh, nos Estados Unidos e Inglaterra, por exemplo. Ao “autenticar” sua entrada nas lojas com o aplicativo, basta o cliente pegar o que quiser e ir embora. Não à toa, a tecnologia baseada em sensores, visão computacional e deep learning se chama Just Walk Out (apenas saia andando, em tradução livre). Em seguida, a listagem dos produtos e o recibo chegam por e-mail. E os dados de pagamento já estão cadastrados no app.
Ser invisível não é fácil, no entanto. Esta nova geração de métodos de pagamento exigirá que as empresas e bancos reforcem as tecnologias de identificação dos consumidores, sem que as etapas de verificação se tornem maçantes para o usuário. Será preciso também investimento pesado em cibersegurança, privacidade e prevenção de fraudes. “Os bancos precisam intensificar o uso de dados com Inteligência Artificial (IA) e Internet das Coisas (IoT) para detectar comportamentos atípicos e também para poder extrair conhecimento”, aponta Fabio Cossini, account executive da Capgemini.
Neste processo, hiperpersonalização e cibersegurança caminham juntas. Isso porque as informações que vêm dos pagamentos dizem muito sobre quem é o cliente, de forma individualizada. Hoje, estes dados estão nas mãos das lojas – e das big techs, como Google e Meta (ex-Facebook). Atualmente, as grandes empresas de tecnologia estão apostando alto no setor por meio de investimentos em paytechs e parcerias com bancos. Uma das motivações para que elas façam isso, segundo o estudo da Capgemini, é capturar e manter os usuários de pagamentos dentro dos seus próprios ecossistemas. E o mercado sente o impacto. Cerca de 72% dos bancos consideram as big techs uma liderança competitiva.
“Eu confio muito na solidez dos bancos tradicionais para o meu momento de vida, mas adoro a experiência que as big techs me oferecem no dia a dia para o meu estilo de vida. Conjugar as duas me traria tranquilidade e uma experiência melhor”, exemplifica Cossini.
Em termos de parceria, as big techs podem dar aos bancos a expertise em inteligência de dados e experiência do consumidor. Por que isso é tão importante para os bancos? Porque a era dos Payments 4.X segue firme na tendência de centralidade do cliente – modelo de negócio em que o cliente está no centro da estratégia e das inovações.
É fato que a pandemia acelerou a adesão das transações digitais. Os métodos tradicionais – dinheiro, cartão, cheques – cederam lugar a dinâmicas mais práticas e instantâneas, como é o caso do Pix, carteiras digitais, cartões virtuais e experiências de compra contactless. A futura implementação da internet 5G nos deixa ainda mais autônomos, tanto digital quanto financeiramente. Tais fatores aprofundam a discussão da adoção da CBDC (Central Bank Digital Currency). É como se o Banco Central, em vez de imprimir notas e cunhar moedas, gerasse e distribuísse dinheiro digital.
A sigla surge como uma alternativa para inibir lavagem de dinheiro, incrementar a inclusão financeira e também frear a possível hegemonia das criptomoedas privadas, que ameaçam a estabilidade do mercado financeiro tradicional. Uma vez que 45% dos consumidores entrevistados pelo estudo da Capgemini afirmaram ter intenção de usar pagamentos em criptomoedas em um ou dois anos, o alerta está dado para as nações.
Nos Estados Unidos, França, Suécia e Rússia, projetos piloto de CBDCs já estão em curso, enquanto Canadá e União Europeia (UE) começaram a planejar as fases de testes da moeda digital. No ano passado, Nova Zelândia e Argentina demonstraram interesse no tema. No Brasil, a criação do real digital é estudada pelo Banco Central desde 2020. No ano passado, a autoridade monetária chegou a publicar as diretrizes que irão nortear a criação da moeda brasileira.
Engana-se, no entanto, quem pensa que o dinheiro digital das federações é uma criptomoeda. “Elas até podem ter proteção de blockchain. Mas para serem emitidas precisam de lastro, da mesma forma que o dinheiro físico”, aponta Kanter, da FGV. No futuro, a tendência é termos mais CBDCs do que papel moeda. Assim, é possível diminuir os custos de impressão de dinheiro e transferir parte do volume em circulação para a moeda digital. E você, já imaginou como usará o dinheiro no futuro?”