Em meio a um cenário de cortes e incertezas, a importância dos programas de diversidade, equidade e inclusão (DEI) nas organizações é posta à prova.
Eu adoraria iniciar 2024 com um artigo sobre tendências e previsões para o avanço dos temas de diversidade, equidade e inclusão (DEI), mas o panorama atual exige atenção e mudança de rota.
Duelos de CEOs em redes sociais, decisões jurídicas que causam retrocessos históricos a direitos já adquiridos por grupos raciais minoritários, proibição de livros e minimização da história ensinada nas escolas, cruzada política contra os direitos da comunidade LGBTI+ e negação de direitos reprodutivos, o que impacta diretamente a carreira das mulheres, é o que mais se viu no ano passado.
Como resultado dessa pressão externa para diluir os projetos de DEI, as empresas têm reduzido seus orçamentos de forma silenciosa e redirecionado seus esforços. Algumas demitiram funcionários da área de DEI e líderes de grupos de recursos de funcionários (ERGs). Outras reduziram programas de treinamento e desenvolvimento e cortaram orçamentos para consultorias externas.
Em meados de 2023, as ofertas de emprego ligados a DEI diminuíram 44% em relação ao mesmo período do ano anterior nos Estados Unidos, de acordo com dados fornecidos pelo site de empregos Even. Isso representa um forte contraste com o período de 2019 a 2022, quando uma pesquisa do LinkedIn havia revelado um aumento de 168,9% para posições de DEI.
Essa tendência no RH em 2024 surge como controversa, especialmente se considerarmos que, até muito recentemente, as iniciativas de DEI eram amplamente promovidas pelos porta-vozes das organizações como essenciais e centrais em suas estratégias de cultura.
A instabilidade e as incertezas do cenário econômico global têm sido usadas como motivo para reduzir significativamente os orçamentos da área. Tudo bem camuflado por um movimento cultural de intenção duvidosa, chamado ‘todas as vidas importam’. Então, é provável que ouçamos muito mais sobre pertencimento e cultura inclusiva do que sobre diversidade de agora em diante.
Aliás, muita gente foi cética em relação ao discurso de líderes em junho de 2020 sobre os compromissos de suas organizações a respeito de DEI. Foi um pouco performático demais, como se as empresas tivessem simplesmente aderido ao movimento para ficarem bem na foto.
O que acontece é que a liderança das organizações está assustada com as recentes mudanças em relação a programas afirmativos e de apoio a DEI, principalmente nos Estados Unidos. A carta enviada por procuradores gerais aos CEOs das 100 maiores empresas da Fortune sobre riscos de discriminação racial nas contratações certamente teve um efeito inibidor nos esforços corporativos de DEI de forma mais ampla. As lideranças têm medo de processos judiciais e de se tornarem alvo de críticas nas redes sociais. Diluir ou abandonar os esforços de DEI pode parecer mais fácil e visivelmente menos arriscado nesse momento.
No entanto, pesquisas apontam que as políticas de DEI ainda são altamente valorizadas por CEOs. Quase dois terços (73%) acreditam que tratar os funcionários de maneira justa melhora o desempenho dos negócios no longo prazo e 70% afirmam que a felicidade dos funcionários é fundamental para a produtividade.
Há também evidências de que há empresas que continuam comprometidas com DEI. Em uma pesquisa divulgada pelo escritório de advocacia trabalhista Littler, 57% dos 320 executivos de alto escalão entrevistados afirmam que expandiram esforços em DEI no ano passado. Apenas 1% diz ter diminuído significativamente seus compromissos com DEI.
As organizações que incorporaram DEI em seu plano estratégico continuarão a colher os frutos de nutrir uma cultura de trabalho inclusiva, em múltiplas camadas. Isso sem falar em criatividade e inovação, que tornam as organizações mais capazes de conquistar participação de mercado.
Já as que optaram por reduzir os investimentos em DEI, ignorando o potencial impacto positivo nos resultados, a decisão de curto prazo pode acarretar perdas no longo.
Há que lembrar, ainda, que os cortes ocorrem no momento em que a indústria de tecnologia dobra a aposta na inteligência artificial. Com menos vozes diversas representadas nos times de desenvolvimento de IA, os produtos resultantes poderão ser menos precisos e mais excludentes para muitos usuários, uma vez que a IA é treinada com base em dados históricos e faltam segmentos críticos da população nesses dados.
Empresas que fizeram cortes nos programas de DEI também podem ter mais dificuldade em atrair e reter talentos no futuro (e no presente). Mais pessoas estão priorizando seu bem-estar e saúde mental e optando intencionalmente por trabalhar para um empregador inclusivo com valores e propósitos que se alinham aos seus. As gerações mais jovens estão mais atentas às atitudes da liderança e vão se lembrar de quem fez o que disseram que iriam fazer.
Como as empresas que acreditam no valor da diversidade vão agir diante desse novo cenário? Isso é assunto para o meu próximo artigo.”