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Por que tantos maus executivos são promovidos?

Você provavelmente já sentiu aquela revolta ao ver pessoas que você não respeita serem promovidas. Um pesquisador argentino explica como isso acontece (e como evitar especialmente a desigualdade de gênero)

Augusto Dias Carneiro
Por que tantos maus executivos são promovidos?
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Por que tanta gente incompetente chega a posições de liderança nas organizações enquanto muitas pessoas talentosas são barradas no baile? Essa é a questão que o psicólogo e empreendedor argentino Tomas Chamorro-Premuzic  – que também dá aulas na Columbia University e no University College London – analisa em seu livro “Why Do So Many Incompetent Men Become Leaders?”.

Antes disso, o psicólogo americano Daniel Goleman já havia ficado famoso por descobrir a relevância da inteligência emocional. Ele propôs que o mundo, que até então dava ênfase ao Quociente Intelectual (ou QI) valorizasse também o Quociente Emocional (QE). 

Goleman definiu QE em cinco componentes: 

  • Autopercepção.
  • Autorregulação.
  • Motivação.
  • Empatia.
  • Habilidade social. 

Nós, já convencidos de que o QI não media muito, substituímos expressões do tipo “beltrano parece que não tem simancol” e “fulano não se enxerga?” pela terminologia de Goleman. 

E entramos no século 21 com autores expandindo esses cinco componentes de Goleman, transformando-os em dezenas de outros aspectos. É um alívio informar que hoje estamos de volta aos cinco quesitos originais. Todos lembram de Daniel Goleman – e quase ninguém se lembra dos outros autores.

Voltando à pesquisa do Tomas, um spoiler: a variável do gênero, periférica no início da pesquisa dele, tornou-se central porque em determinado momento ele observou que boa parte dos líderes incompetentes eram homens. 

A guerra dos sexos chega ao quociente emocional

Nas pesquisas, observamos que as mulheres apresentam QEs em média 15% superiores aos dos homens, com QIs praticamente empatados entre os dois gêneros. Mas se o QE é tão importante, por que as mulheres estão subrepresentadas em posições de liderança?

O argentino responde: ele descobriu que quatro qualidades dos grandes líderes, sejam homens ou mulheres – empatia, autopercepção, integridade e humildade –, podem, na verdade, se transformar em obstáculos para a promoção (embora sejam inequivocamente importantes em posições de liderança). 

O livro dele traz muitos exemplos. Mas aqui eu deixo por conta de vocês pensar em alguém nas suas empresas que foi promovido apesar de falhar claramente em um ou mais desses quatro quesitos.

Se o QE é tão importante, por que as mulheres estão subrepresentadas em posições de liderança?

Essa descoberta é reforçada por outra: mulheres que chegaram a posições de liderança muitas vezes exibem comportamentos tipicamente masculinos. Porque – em boa parte inconscientemente – hackearam o processo. 

Isso ele chama de Síndrome de Margaret Thatcher, referindo-se à primeira mulher a ocupar o cargo de primeira-ministra do Reino Unido, entre 1979 e 1990. 

Tomas considera que esse processo de seleção pelo avesso é um dos grandes dilemas das empresas hoje em dia. Sem falar no quanto prejudica as discussões sobre equidade de gênero em posições de liderança. 

Sucesso pessoal nem sempre tem a ver com mérito

Eis o que o argentino considera a principal conclusão de sua pesquisa: entrevistando pessoas já em posições de liderança, ele observou uma dificuldade geral em conectar seu sucesso pessoal com quanto valor eles agregaram a suas empresas. 

Investigando como essas pessoas chegaram onde chegaram, ele observou a relativa ausência de referências aos termos “talento”, “mérito” e “potencial”.    

Tem mais: algumas empresas têm freios de mão culturais que se manifestam logo nas entrevistas de recrutamento – e surgem de novo mais adiante em decisões de promoção. Eis os três mais danosos:

  • Profissionais com autopercepção elevada podem ser erroneamente interpretados como pessoas que enfatizam demais suas fraquezas.
  • A caprichada autorregulação de algumas pessoas pode soar a quem ouve como falta de entusiasmo.
  • Candidatos com empatia elevada podem ser dizimados porque os entrevistadores acham que dificilmente seriam capazes de tomar decisões difíceis, como demitir alguém (eu já vi isso acontecer). 

Por outro lado, Tomas descreve os três “capitais” que cada pessoa traz para a empresa:

  • Capital Intelectual: suas habilidades técnicas, experiência e idiomas.
  • Capital Social: seus contatos e relacionamentos. O pensamento de que “contatos são contratos” já foi mais importante, mas não desapareceu. 
  • Capital Psicológico: capacidade de aprender, curiosidade, flexibilidade – e, claro, QE. 

Como as organizações podem evitar isso

Para o psicólogo argentino, ao selecionar pessoas para recrutamento e promoção, as organizações devem perceber e medir como cada uma utiliza seu ferramental intelectual, social e psicológico para converter em resultado os recursos que recebe. 

Em seu entender, o capital psicológico deveria ser a principal ênfase desses processos. Suas três recomendações para as empresas são: 

  • Explicitar como medem o valor que seus principais líderes trazem ao negócio – e como está atrelado à forma como são remunerados.
  • Dar mais ênfase às prioridades de resultado das empresas (lucratividade, qualidade, inovação) e ao vínculo dos líderes com elas.
  • Criar processos de promoção que sejam “cegos” em relação a gênero (ou gender-blind, em inglês).

Para quem se interessa em saber mais, recomendo o resumo que Tomas Chamorro-Premuzic fez de seu livro na entrevista que deu para a McKinsey em maio de 2024. Sobre os freios de mão culturais que eu “roubartilhei” de Goleman, vêm de um artigo da PWC sobre três autores do passado (Festinger, Hertzberg e Goleman).

Augusto Dias Carneiro
Coach, headhunter, mediador e board member, Augusto Dias Carneiro é sócio da Zaitech Consultoria. É autor do livro Guia de Sobrevivência na Selva Empresarial. O lançamento de sua próxima obra, O Livro das Ideias: Inovação e Empreendedorismo, está previsto para dezembro de 2024.

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1 comentário

  • pedrojose219 disse:

    Vivemos esta realidade no cotidiano onde deparamo-nos com varios casos ineditos. Se em outras praças os fatores que promovem individuos mediocres à posições de Liderança são os que o artigo enfocou; a realidade para o nosso mercado contextual pode ser outra.
    Para os países tercio-mundistas, a promoção de individuos mediocres, tem como fatores: a politicagem, o tráfico de influências, a corrupção, o nepotismo, a bajulação etc.

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