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O caminho para o carbono zero exige líderes de P&D mais ativos

CTOs e outros executivos que comandam áreas de pesquisa e inovação ocupam posições privilegiadas como agentes fundamentais para apagar as pegadas de carbono

Dan Edwards e Michael Zeitlyn
12 de julho de 2024
O caminho para o carbono zero exige líderes de P&D mais ativos
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Grandes empresas ao redor do mundo fizeram promessas de chegar ao saldo zero de emissões de carbono, mas promessas são uma coisa, enquanto ações são outra. É claro que é um movimento de difícil sustentação. A redução nas emissões é indispensável para o bem do planeta, mas exige dos negócios um novo jeito de pensar e operar, colaboração com mais entidades externas, confiar em novas formas de colher e tratar os dados, além de novos desenvolvimentos, o que coloca os líderes de P&D e inovação no centro do processo.

O Science Group convocou esses profissionais para o fórum recentemente – participaram executivos da Amcor, Bayer, Mars, Pepsico, Procter & Gamble, Solvay e Stepan, entre outros – para debater meios pelos quais as empresas podem traduzir suas ambições de zero emissão em avanços concretos. Queríamos em especial ajudar a definir o papel crucial que as áreas de inovação podem desempenhar nessa jornada. Neste artigo, destacamos os insights que surgiram nesse fórum sobre as práticas que ajudam a construir um caminho de sucesso para ambos, o planeta e as empresas.

A ordem é agir

Se as empresas querem que suas promessas de emissão zero sejam mais do que aspirações bem-intencionadas, precisam fazer dessas promessas um valor central: a gestão deve perder o sono com elas, do mesmo jeito que já perdeu pensando em segurança, qualidade e lucro. Agir sobre esse tema é uma iniciativa multifuncional, e a divisão de tarefas ainda é obscura. Marketing, distribuição e outras funções vão ter sua parte na redução dos gases de efeito estufa a seu tempo. Compras, por exemplo, pode conseguir efetivar reduções no curto prazo, enquanto as ações de P&D (área, por definição, ligada ao futuro) podem frutificar em três, cinco ou até dez anos. A chave, é claro, é que todas as áreas estejam trabalhando em conjunto na direção do atingimento de objetivos claramente definidos. P&D deve, rápida e explicitamente, traçar seu papel no processo de redução da pegada de carbono, atentando para as diferenças que apresenta em relação às outras funções. A capacidade dos profissionais de P&D de apresentar argumentos científicos aos demais executivos pode ser de grande ajuda aos colegas que precisam elaborar planos similares.

Montar um esquema de colaboração entre todas as partes de uma empresa pode ser um processo de autodescoberta, que mostra interdependências e alianças em potencial. Como P&D vai fundo em seus objetivos, seus gestores deveriam avaliar também entidades externas às suas organizações (fornecedores, clientes, agências reguladoras, entidades não lucrativas e até concorrentes) que possam ser chamadas para o que, no fim das contas, será a missão mais universal de suas vidas. Outras empresas podem muito bem ter valiosas iniciativas em andamento, e as lideranças devem se familiarizar com todas, e entender a interconexão entre elas.

Porém é essencial que as empresas deem a seus gestores de P&D e tecnologia uma ordem clara de reduzirem os gases de efeito estufa. Uma vez dada, eles estarão bem posicionados para fomentar as mudanças que garantam que futuros produtos e serviços apresentem menor emissão desses gases. As equipes de inovação e P&D estarão na linha de frente, promovendo essa redução pelo uso de materiais alternativos, redefinição de design de produtos e por tecnologias mais adequadas ao controle das mudanças climáticas. Para funcionar, o zero carbono deve fazer parte de todo projeto desde o começo, para que, caso a pegada apareça, seja eliminada a hora e a tempo. Cada discussão dentro de P&D deve levar em conta os gases do efeito estufa. E, para que não pensem que esta é apenas uma ação de autopromoção, a área deve ser avaliada pelos resultados que de fato obtiver.

Gerenciar o portfólio cotidiano de P&D pró-carbono zero, não só projetos especiais

Gestores de P&D devem agora verificar o quanto seu atual portfólio se adequa à redução da pegada de carbono para saber se está de acordo com seus objetivos. Atingi-los significa saber exatamente onde e quando essa redução acontecerá e não confiar na sorte ou em tecnologias futuras que mal se vislumbram.

Até agora, sustentabilidade tem sido mais o foco de projetos especiais. Essa abordagem pode garantir investimentos seguros, demonstrar ambições, gerar uma certa dinâmica e polir a imagem das empresas, e esses são, sem dúvida, estímulos sedutores. Entretanto, argumentamos que integrar a redução de carbono à ação cotidiana da P&D é ainda mais vital. O sucesso depende da performance do conjunto de produtos e serviços, não da ascensão e queda de um ou outro projeto. Não há nada errado em especular sobre umas poucas possibilidades de longo prazo, mas apostar nos resultados de todo o portfólio é bem mais sábio. Nem todo projeto terá efeito zero carbono. E, francamente, P&D pode aceitar que um deles em particular tenha um resultado aquém do esperado, se houver uma necessidade urgente, ou se outra área puder compensar de outra maneira, desde que o conjunto como um todo permaneça alinhado ao objetivo.

Líderes de P&D devem se preparar para providenciar relatórios sobre o impacto do portfólio de produtos sobre a emissão de gases do efeito estufa. Medir a participação líquida (ainda que por uma estimativa da ordem de grandeza do impacto futuro) irá permitir que a empresa equilibre suas necessidades comerciais e as ações sobre a mudança climática. Oferecer informações ambientais, sociais e de governança se tornará mais importante à medida que consumidores e stakeholders insistirem em saber quais organizações têm estratégias sólidas de sustentabilidade, e as próprias empresas notarem que essas estratégias podem reduzir custos, estimular o crescimento e reduzir questões junto a instâncias normativas. Os dados sobre o efeito estufa ainda não são exatos como o momento exige, mas devem certamente melhorar. Enquanto isso, as áreas de P&D precisarão se virar com o que está disponível e aceitar aproximações.

Atenção à realidade comercial emergente

É comum dizerem que as empresas precisam escolher entre ser “verdes” e ser lucrativas. Não vamos fingir que não há uma sombra de verdade nisso. Mas com o comportamento dos consumidores mudando, o ambiente regulatório evoluindo, as histórias sobre danos à reputação proliferando e as notícias sobre os impactos ambientais surgindo em toda parte, uma nova realidade comercial irá se impor. Por enquanto, P&D pode começar pela identificação de clientes, produtos e marcas com uma afinidade prévia pela mensagem zero carbono.

Isso está ao alcance da mão. É aqui que os produtos voltados para a sustentabilidade podem se valer de uma imagem verde, ganhando uma vantagem competitiva. Em lugares nos quais as normas ou padrões favorecem ou até exigem produtos com redução de emissões, o mercado provavelmente vai aceitar uma performance ligeiramente menor ou um preço ligeiramente maior. Onde quer que a porta já esteja aberta, os inovadores podem capitalizar sobre o valor de mercado de um produto “limpo”. Nos demais lugares, precisarão ser criativos e buscar continuamente por sinergias e consumidores fiéis, e onde a inovação para a queda de emissões traga outro tipo de vantagem.

Idealmente, inovar para atender às necessidades do mercado, ou seja, com base em parâmetros convencionais, vai gerar oportunidades colaterais para reduzir a pegada de carbono. Ninguém vaicriar objeções a essa redução se parecer ser uma feliz coincidência. Existem processos de manufatura que, ao reduzir as emissões, podem também levar à redução de custos de capital ou energia. Projetos que podem fazer uso deles devem ser priorizados e os gestores de P&D devem se articular para obter tais benefícios, mesmo que a prioridade número um seja o corte de despesas.

A proposta a seguir pode parecer totalmente contraintuitiva, mas os heads de P&D também deveriam considerar escolhas entre preço e/ou performance, se um produto com redução de emissão de carbono permitir um tipo diferente de ganho. As palavras “novo” e “melhor” foram fundidas no vocabulário de publicidade por mais de um século, o que nos diz que as empresas não se animarão em anunciar terem feito um produto inferior em alguma medida porque queriam beneficiar o ambiente. Mas as novas normas, assim como o consumidor e o stakeholder, começam a pedir por isto.

“ATINGIR METAS DE ZERO CARBONO EXIGE CORAGEM”, disse no fórum Robert Reiter, responsável por P&D na divisão Crop Science da Bayer. “Vão acontecer momentos de tensão, e chegará um ponto e que será preciso fazer escolhas quando as soluções fáceis terminarem. Acho que podemos esperar por uma regulamentação que aqueça o ambiente competitivo, mas existem situações em que uma empresa precisa abrir o caminho.””

Dan Edwards e Michael Zeitlyn
Dan Edwards é CEO do Science Group, empresa de consultoria em ciência, engenharia e tecnologia sediada em Cambridge, no Reino Unido. Michael Zeitlyn preside os serviços de consultoria do Science Group.

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