Para liderar a transformação digital contínua de sua empresa, ele tem de seguir três princípios e, além disso, fazer a transformação digital de si próprio
“Em 2021, o e-commerce superou os shopping centers no Brasil em receita. De acordo com um estudo da gestora de investimentos independente Canuma Capital, as vendas do comércio eletrônico saltaram de R$ 160 bilhões, em 2019, para R$ 260 bilhões em 2021 – lembrando que esses dados incluem transações cross border, representada pela operação de marketplaces estrangeiros como Amazon, Shopee e Aliexpress e que é responsável por cerca de 20% desse total, segundo dados da Ebit|Nielsen. No mesmo período, a receita total dos shoppings caiu de R$ 190 bilhões para R$ 175 bilhões.
Esses números não representam perda de relevância dos shoppings, mas demonstram o impacto da combinação entre o cenário macro e o comportamento dos clientes para os negócios, escancarando a urgência da digitalização das vendas para todo tipo de comércio. Quanto ao varejo restrito, por exemplo, a porção do e-commerce passou de 6,8% em 2019 para 12,7% em 2021, provando que o movimento por transações online segue em constante alta. Diante disso, o que deve acontecer com o varejo em 2022, com a forte expectativa da retomada do presencial, apesar das novas variantes do coronavírus?
Aconteça o que acontecer, a expectativa é de fortalecimento ainda maior do papel de CIO – o executivo-chefe de informação. Porque, aconteça o que acontecer, a digitalização das operações das empresas varejistas deve ganhar ainda mais tração, o que vai muito além de ter um e-commerce ou presença nas redes sociais. Um varejo digital é aquele que usa a tecnologia a favor da agilidade, de uma operação mais eficiente, de experiências melhores para o consumidor, de inovação – em especial, lançamento de serviços – e de modernização da cadeia de fornecimento. Tudo isso, que favorece a geração de receita, depende fortemente do CIO e de seu desempenho.
O velho diretor de informática tem recebido cada vez mais nomes, conforme a ênfase do cargo: além de CIO, pode ser conhecido como CDO (executivo-chefe de dados), CIDO (executivo de informação e digital) e CTO (executivo-chefe de tecnologia, que, na definição original, tem mais foco no cliente externo enquanto o CIO foca o cliente interno).
Independentemente do nome escolhido, esse executivo não tem apenas entendimento profundo de tecnologias; ele combina isso com visão do negócio e grande flexibilidade, sendo uma peça indispensável para organizações que desejam prosperar num ambiente cheio de incertezas e volatilidade.
No que diz respeito à etapa prática da transformação digital do varejo, o CIO deve se responsabilizar por três pontos principais:
1.Tornar a infraestrutura tecnológica invisível.2.Entregar aplicativos no ritmo da inovação.3.Fazer a ideia de segunda-feira virar realidade na sexta-feira.
Em relação à própria transformação digital, o CIO pode considerar mais seis pontos adicionais:
1.Escolher as estratégias com as quais vai se alinhar.2.Conviver com a “”shadow IT””.3.Mudar a mentalidade de despesa para receita.4.Saber fazer pitches além dos números.5.Revisar como habilidades são avaliadas em sua equipe.6.Incluir na gestão de seus projetos o valor gerado.
Comecemos por explorar cada um dos três conceitos-chave da digitalização do varejo, sintetizados no The digital CIO’s handbook for retailers, um guia especializado produzido pela Capgemini.
Pense na experiência de usar uma Apple TV pela primeira vez. Você remove o dispositivo da embalagem, conecta-o à TV, digita sua senha e, voilá, está pronto e funcionando. Sem configuração demorada, sem processos mirabolantes, sem manual do usuário. Ele apenas funciona.
Quando menciona a infraestrutura invisível, é a isso que a Capgemini se refere. Trata-se do uso de soluções que dispensam a necessidade de investimento em infraestrutura básica para oferecer uma melhor experiência ao usuário.
Dentro desse pacote de soluções está a migração para a nuvem. Sinônimo de operações inteligentes nas empresas, a nuvem oferece agilidade aprimorada, ciclos de desenvolvimento mais rápidos, redução de custo e automação. Isso porque ela combina todos os componentes necessários para uma verdadeira transformação digital. E as empresas estão cientes disso – tanto que alguns estudos projetam a migração de mais de dois terços das cargas de trabalho para a nuvem nos próximos anos.
O problema é que apenas metade das organizações aproveita todo o potencial oferecido pela tecnologia atualmente. Para usufruir os benefícios na sua integralidade, a recomendação da Capgemini é reconhecer que a nuvem é o meio, não um fim em si. O que requer uma mudança na cultura, nas pessoas e nos processos, além de planejamento – cabe ao CIO construir um business case e um roteiro que transforme a empresa.
Experiências de usuário inovadoras, ciclos de inovação ativos e alta capacidade de resposta ao mercado estão entre as características dos empreendimentos digitais de sucesso. Especialmente se essas experiências acontecem nos aplicativos que gravitam o negócio.
Neste ponto, transformar significa modernizar o software existente, adotar uma abordagem moderna para o desenvolvimento entre pessoas, processos e tecnologia – mesclando soluções de nuvem, como microsserviços e conteinerização, integração de nuvem híbrida, metodologias ágeis e DevOps.
Com uma base sólida, o CIO permite que a varejista execute e se adapte rapidamente às condições de um mercado em constante inovação – e até mesmo preveja produtos e serviços antes que sejam necessários. Para fortalecer sua posição estratégica, o CIO deve justificar de forma clara a razão para tal movimentação junto ao CEO e à alta liderança por meio de um roadmap com projeções de curto, médio e longo prazo, desenhado simultaneamente a conquistas da estratégia do negócio.
A recomendação para o CIO é começar por um projeto pequeno e que seja nativo na nuvem, a ser acompanhado por uma equipe pequena e habilidosa, apaixonada por tecnologia. Assim, os riscos podem ser controlados e novas metodologias, testadas. De acordo com Capgemini, o CIO deve selecionar colaboradores que sejam agentes de mudança e tenham a ambição de se tornar futuros líderes, pessoas que inspiram a transformação. Em projetos-piloto, essa equipe tem o poder de aprofundar suas habilidades e cascatear os ensinamentos em iniciativas em suas áreas de atuação.
Fazer a ideia de segunda-feira se materializar na sexta. Esse é o terceiro conceito que todo o CIO precisa abraçar, segundo a Capgemini. No mundo digital, as organizações precisam repensar os negócios com a velocidade de uma startup. Isto é, a inovação que costumava levar meses para virar realidade, desde o surgimento da ideia, deve levar apenas alguns dias.
Fazer isso envolve a mudança de um modelo baseado em projetos para um modelo centrado em produtos. O CIO pode construir esse cenário por meio de tecnologias emergentes – internet das coisas, inteligência artificial, machine learning, entre outras. E, claro: como no primeiro e no segundo conceito, aqui também existe a necessidade de uma mudança na cultura da empresa, nas pessoas e nos processos.
Pensando em uma estratégia DevOps, o CIO tem a missão de construir um time ágil e preparado para incorporar uma “orientação a produtos”, tendo como norte a aplicação de tecnologias de forma singular. Não há mais tempo para equipes superespecializadas e “largadas em seu quadrado”. Agora, o time precisa aprender a falar a mesma língua, especialmente a língua do negócio, em uma velocidade jamais alcançada antes.
Para promoverem a digitalização de suas empresas, os CIOs precisam se transformar digitalmente, como entende Stephen Jay Andriole, que é professor da Vilanova University e foi diretor da Darpa, maior agência estatal de pesquisa militar do mundo. O especialista explica que esses executivos devem continuar a providenciar para que a parte técnica-operacional das empresas continue a funcionar sem tropeços – as redes de comunicação precisam estar ativas, softwares devem funcionar, dados devem estar sempre seguros e acessíveis. Mas, além de mantenedores de infraestrutura tecnológica, eles devem passar a se ver como facilitadores digitais da criação de valor, o que requer adotar novos modos de operar. Andriole identifica alguns deles:
Engajar-se nas estratégias de negócios já vem sendo uma prioridade para CIOs há tempos. No entanto, a maioria deles ainda reclama de ineficiência no planejamento de suas empresas, com estratégias em excesso. Por isso, eles devem escolher a quais planos se alinham. Segundo Stephen Jay Andriole, em casos de conflitos entre planos, as prioridades estratégicas de curto prazo devem ser favorecidas. Não havendo conflitos, o horizonte estratégico de três a cinco anos também precisa ser contemplado, pois requer os maiores investimentos.
A chamada “shadow IT” – conceito que pode ser entendido como processos de TI que acontecem fora do espaço e do controle do departamento de TI tradicional – ainda deixa muitos CIOs se sentindo incomodados. Eles veem essa shadow IT como concorrente a eliminar. No entanto, para Andriole, a shadow IT deve ser vista como uma consequência natural da governança da tecnologia centralizada no departamento de TI, que às vezes impede as áreas de inovarem por isso. A shadow IT não deve ser o novo modo de operar da empresa, diz Andreole, mas os CIOs têm de aprender a reconhecer quando devem de fato se opor a elas (porque prejudicarão todo o sistema), e quando elas são benéficas (no sentido de levarem ao aumento de receita), e aceitar o segundo caso.
A grande preocupação dos CIOs sempre foi a redução das despesas com tecnologia, mas esse novo momento da tecnologia pede aos CIOs que abracem uma nova missão financeira: focar na geração de receita em vez da redução de custos. Isso não é fácil de fazer, como diz Andreole. Os CIOs devem entender que se encontram numa posição privilegiada para entender as tendências de tecnologia no meio corporativo e desenvolver novos aplicativos e plataformas, inclusive acionando parcerias.
Na hora de aprovar investimentos em tecnologia com os líderes de negócios e/ou com o conselho de administração, os CIOs, em sua maioria, ainda se apoiam em business cases fortes. Eles se comunicam principalmente com evidências e isso não é ruim; as comunicações empíricas-quantitativas são eficazes na era do big data. Mas, segundo Andriole, esse tipo de linguagem não dá espaço para a imaginação. Na visão do especialista, novas iniciativas são aprovadas ou rejeitadas por motivos que têm mais a ver com a imaginação do que com dados. Faz sentido: se o novo ainda não aconteceu, não há dados sobre ele; as pessoas precisam imaginá-lo. Então, os CIOs devem incorporar a habilidade de storytelling.
A maioria dos gestores costuma ter dificuldade de fazer avaliações objetivas das habilidades e competências de suas equipes e isso não é diferente com os CIOs. Avaliam com base variáveis subjetivas – relacionamentos, referências de amigos, reputações etc. o que faz com que algumas equipes de tecnologia se tornem “permanentes” mesmo com habilidades obsoletas – o que se agrava no cenário de escassez de profissionais de tecnologia. Stephen Jay Andriole insiste em que os líderes de TI se dediquem mais à avaliação de suas equipes, usando um conjunto objetivo de métricas de habilidades e competências, inclusive comportamentais.
Gerenciar projetos é sempre uma prioridade para equipes de TI. Mas, na visão de Andriole, essas equipes continuam a medir sobretudo os marcos, custos e riscos do projeto (ou do software associado a ele). É mandatório que meçam também o valor que o projeto agrega ao negócio. Na prática, segundo o especialista, isso vai mudar até os filtros para aprovar e rejeitar projetos. Passarão a focar, por exemplo, atividades voltadas a suporte ou melhoria de produtos e serviços.
Um exemplo de CIO de varejo dos tempos atuais é Rodrigo Perenha, diretor de tecnologia do Mercado Pago. Quando se olha para suas participações na mídia ou em eventos, ele sempre fala em agilidade, não em tecnologia. E define sua cultura de agilidade (segundo ele, a cultura de todo o Mercado Livre) como uma “paixão por agilidade”. Perenha explica que os times da organização se distribuem em torno de produtos e são multidisciplinares, com profissionais de produtos, de negócios e de tecnologia, que cuidam da concepção aos testes e à execução e sustentação.
De acordo com Perenha, um ponto crucial da agilidade no Mercado Livre são as “capabilities” que podem ser usadas por todas as equipes de produtos – em vez de estas terem de ser desenvolvidas do zero para um determinado aplicativo. Um exemplo é o motor de recorrência. Os diferentes times vão usando capabilities e pedaços de outros APIs para fazer o que precisam fazer. É isso o que torna possível ter uma ideia na segunda-feira e uma entrega já na sexta.
Outro ponto importante crucial dessa figura do CIO é a importância dada à criação de valor nos projetos. Perenha não enxerga MVPs como MVPs (sigla em inglês de produtos mínimos viáveis), e sim como MLPs (produtos mínimos amáveis). Os produtos mínimos feitos pelos profissionais de tecnologia têm de ser amados e desejados pelos clientes. Isso é valor.
O Fórum: A era da hiperpersonalização é uma coprodução MIT Sloan Review Brasil e Capgemini. Acesse os demais conteúdos deste fórum para conhecer todo o potencial que a hiperpersonalização fornece ao seu negócio clicando aqui.
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