Nova contribuição proposta pela reforma tributária exige cadastro e prestação de informações digitais pelas plataformas domiciliadas no exterior
A reforma tributária retornou à pauta da agenda política do Brasil, após apresentação do Projeto de Lei n° 3.887/2020, assinado pelo Ministro da Economia, Paulo Guedes. Como destaque, a PL visa a substituição do PIS e da COFINS e PIS/COFINS-Importação por um imposto único, a chamada Contribuição Social sobre Operações com Bens e Serviços (CBS).
Ainda que a proposta não detalhe de maneira clara todos os pontos dessa nova contribuição, a união de PIS e COFINS é um antigo desejo de diversos atores do sistema, uma vez que esses tributos costumam se sobrepor e abrem brechas para aspectos que geram litígios.
Entre os tópicos de atenção do Projeto está a previsão de responsabilização das plataformas digitais domiciliadas no exterior pelo recolhimento da CBS no caso de importação de bens e serviços por pessoas físicas, as conhecidas operações B2C (Business to Consumer).
Os principais debates sobre esse assunto têm se concentrado na possível inconstitucionalidade dessa responsabilização. Porém, existe outro aspecto dessa regra que apresenta igual relevância e necessita atenção: a obrigação acessória de cadastro e prestação de informações que será exigida dessas plataformas em relação às operações de importação realizadas por seu intermédio.
A proposta do Governo Federal exige que as plataformas digitais que residem no exterior se cadastrem perante a administração tributária para cumprimento das obrigações relativas à CBS, sendo que tal obrigatoriedade será condicionada à disponibilização, pela Secretaria da Receita Federal do Brasil, de cadastro eletrônico.
Contudo, não há qualquer informação sobre como esse cadastro será realizado, seja na exposição de motivos, no Projeto ou mesmo nas perguntas e respostas disponibilizadas pelo Ministério da Economia. Os documentos e apresentações oficiais do governo não dão quaisquer pistas a esse respeito, mencionando apenas que o cadastro será “simplificado”.
Essa questão, portanto, representa grande impacto para as empresas de tecnologia que detêm plataformas digitais no exterior e desejam oferecer seus serviços aos brasileiros; por isso, precisa ser melhor detalhada com antecedência pelo Governo Federal.
O governo deve esclarecer o passo a passo de como será realizado o cadastro dessas plataformas, bem como fornecer informações e os respectivos layouts do programa que será disponibilizado pela Receita Federal para o cumprimento dessa nova obrigação.
Esses dados são fundamentais para que as empresas detentoras das plataformas, cujas atividades são, por essência, ininterruptas e muito dinâmicas, tenham tempo hábil para toda a preparação operacional e sistêmica, garantindo que serão capazes de cumprir a nova obrigação tão logo entre em vigor.
Seria importante que o governo também indicasse, desde já, quais informações serão coletadas dessas plataformas digitais domiciliadas no exterior.
Nesse aspecto, o PL 3.887/2020 dispõe que o cadastro perante a RFB será feito para “cumprimento das obrigações relativas à CBS”. Isso significa que as informações exigidas das plataformas devem, necessariamente, estar adstritas aos fatos geradores da CBS, sendo vedado ao fisco exigir qualquer outra informação que seja irrelevante para esses fins.
Essa limitação às informações que poderão ser solicitadas das plataformas decorre não só da própria redação do PL, mas também da recente Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (Lei n° 13.709/2018).
Segundo a LGPD, a administração tributária deve observar os princípios da finalidade e necessidade na coleta e tratamento das informações dos particulares.
Assim, no caso da CBS, as informações coletadas para cumprimento das obrigações relativas à contribuição não poderão extrapolar a finalidade para a qual foram obtidas – por exemplo, não se deve exigir informações para aferição do recolhimento de outros tributos. Esses dados devem se limitar estritamente ao que é indispensável para verificar a incidência da CBS nas respectivas importações.
Em resumo, a regulamentação do cadastro das plataformas digitais domiciliadas no exterior necessita de tanto debate e atenção quanto a constitucionalidade dessa tentativa de responsabilização das plataformas. Somente assim haverá previsibilidade e razoabilidade na implementação dessa nova obrigação acessória.”