Embora o Brasil lidere a implementação de iniciativas de inteligência artificial na América Latina, pesquisa da everis mostra que é preciso aprofundar os aspectos estratégicos e o potencial de negócios que a tecnologia pode oferecer às empresas
A experiência de ser atendido por um bot deixou de ser algo presente apenas no cinema, assim como máquinas que aprendem de acordo com inputs dados por humanos. Esses são apenas dois exemplos de como a inteligência artificial (IA) tem sido aplicada em nosso dia a dia.
Contudo, seu conhecimento mais aprofundado tem se tornado diferencial competitivo para a sobrevivência das empresas no século 21, o que levou a everis, consultoria de negócios e TI do Grupo NTT DATA, em parceria com o MIT Tech Review em espanhol, a realizar uma pesquisa para entender como está a adoção da IA na América Latina.
Feita com mais de 40 diretores e cem executivos que lideram a adoção de IA em suas empresas, todas com mais de mil empregados e receitas superiores a US$ 100 milhões, o estudo Inteligência artificial em empresas latino-americanas – uma visão geral da adoção e tendências da região) teve como objetivo apontar os aspectos estratégicos desta adoção e seu potencial para auxiliar na transformação digital (e também nos resultados) dos negócios da região. Foram entrevistados executivos de C-level de Argentina, Brasil, Chile, Colômbia, México e Peru.
O levantamento mostrou que o Brasil é o país mais avançado em projetos de IA na região, principalmente porque possui uma economia mais forte e empresas estabelecidas que já investem em oportunidades de IA, seja em iniciativas relacionadas às experiências do cliente, em eficiência operacional ou em modelos preditivos de avaliação de riscos nos setores de saúde, operações ou prevenções de fraudes.
De acordo com Evandro Armelin, head de data & analytics da everis Brasil, embora o Brasil seja a economia mais potente da América Latina, há uma dependência (esperada) de tecnologias oriundas dos Estados Unidos e da China e também faltam iniciativas mais estruturais, no sentido de fomento governamental, por exemplo, que possam possibilitar o conhecimento sobre a tecnologia e fortalecer todo o ecossistema de inovação.
“Além disso, preparar as empresas para a adoção massiva da IA depende também de uma série de fatores, como aspectos culturais, o conhecimento empresarial sobre a tecnologia, o desenvolvimento de mão de obra interna, a criação de parcerias com startups, terceiros e universidades, a montagem de equipes multidisciplinares e a mentalidade que permita escalar as capacidades e as iniciativas”, afirma.
O estudo realizado pela everis constatou que a adoção da IA ainda enfrenta seis principais desafios que precisam ser encarados pelos países latino-americanos:
Responsáveis por levar ideias aos comitês executivos e a defender iniciativas que promovam transformações e revoluções nos negócios, os líderes exercem papel fundamental na adoção massiva de estratégias de IA nas empresas. Aquelas que possuem soluções mais claras, avançadas e robustas possuem gestores da alta direção que conhecem os resultados que a IA pode promover nas organizações.
A desconexão entre os desafios do negócio e sua solução por meio da IA por quem toma as decisões é fatal para a adoção de novas tecnologias, impedindo que sua compreensão, visão e adoção sejam estratégicas e transversais.
Quase como uma consequência do primeiro desafio, quando se há a desconexão da liderança ou a falta do sponsorship para iniciativas de IA nas empresas, os investimentos são barrados na origem, vistos como despesas.
Essa falta de apoio da liderança e restrições orçamentárias aparecem no levantamento da everis: 55% dos entrevistados disseram que as empresas investem apenas de 1% a 10% dos recursos de TI em IA; ao mesmo tempo, nove em cada dez executivos entrevistados entenderam que os investimentos são insuficientes em suas organizações e outros 89% afirmaram que há falta de capital para iniciativas de IA.
A falta de mão de obra para trabalhar com IA é das maiores dificuldades para as empresas em toda a região. O perfil desse profissional, que reúne competências tecnológicas, habilidades matemáticas e conhecimento estatístico, além de capacidade para correlação dos dados obtidos com o negócio, é considerado quase como um unicórnio pelas organizações.
A pesquisa realizada pela everis aponta que 39% das empresas entrevistadas desenvolvem sua equipe de IA em casa, enquanto 26% buscam profissionais externos e 23% contratam consultores externos.
“Não há faculdades que formam esse profissional, e o desafio não está apenas em encontrá-lo, mas retê-lo é tão difícil quanto, pois embora o mercado esteja disposto a pagar valores altíssimos que até não se encaixam em suas réguas de remuneração, a motivação é essencial, pois são pessoas que precisam estar em projetos inovadores sempre”, aprofunda o executivo.
A aposta na IA leva em conta questões éticas e o ambiente regulatório local. No guarda-chuva da ética, as organizações precisam se preocupar com o desenvolvimento de algoritmos sem vieses ou inclinações racistas, por exemplo, e com a aquisição segura e utilização de dados.
“Há uma busca frenética por dados que é justa e faz parte do negócio, mas é preciso refletir: eu acho que tenho o direito de buscar os dados do meu cliente, mas não que tenho o direito de ter todo e qualquer dado do meu cliente. Que fim, portanto, darei a esse uso?”, provoca Armelin.
Essa reflexão resvala no tema da regulação, pois os países seguem leis diferentes ou estão discutindo ou implementando legislações sobre dados e IA. As companhias devem entender as especificidades regionais, se adequar e agir de maneira responsável com clientes que estão localizados na Europa, nos Estados Unidos ou na Ásia, por exemplo.
Implementar qualquer iniciativa de IA ou machine learning sem dados é impossível. Assim, a questão da disponibilidade de dados se faz primordial, e ainda é um grande desafio não só para o Brasil, mas para toda a América Latina. Armazenamento, processamento, análise e limpeza de dados são etapas essenciais para o tratamento e a qualificação dos dados.
“Existem companhias em que o dado não está armazenado, outras em que o dado não tem qualidade. É preciso desenvolver uma estrutura de captura de dados robusta que tenha como norte a segurança e a privacidade desses dados”, aponta Armelin.
Por definição, iniciativas com caráter de inovação precisam ser testadas, adaptadas e não podem ser encaixadas nos métodos tradicionais de projetos, com começo, meio e fim pré-determinados. Assim, sua implementação exige uma mudança organizacional e cultural das empresas, fazendo que os envolvidos também estejam preparados para a experimentação, para acertos e erros, para o fracasso.
Organizações mais tradicionais resistem não só à adoção de novas tecnologias, mas também à mentalidade inovadora. O estudo apontou que 60% dos gestores têm receio de conversar com seus times sobre a adoção de IA e futuros impactos, especialmente devido ao receio da redução de postos de trabalho, ainda que 65% tenham afirmado que não houve eliminação de empregos por conta da IA. Ao mesmo tempo, 49% apontaram que a adoção da IA não criou novas vagas.
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