8 min de leitura

Como a adoção da IA impacta no perfil dos profissionais

A busca pelos talentos especializados para desenvolvimento de projetos de IA é desafiadora e exige a montagem de equipes multidisciplinares

Angela Miguel
29 de julho de 2024
Como a adoção da IA impacta no perfil dos profissionais
Este conteúdo pertence à editoria Gestão de talentos Ver mais conteúdos
Link copiado para a área de transferência!

Entender profundamente todas as variáveis que envolvem um projeto de inteligência artificial (IA) ou a construção de algoritmos baseados em machine learning ou em deep learning exige um profissional muito específico e cada vez mais em alta nas companhias.

No momento em que as companhias percebem o valor da integração de ativos internos e fontes de dados de terceiros, os antigos profissionais de TI, delegados a tarefas muito específicas, se tornaram estrelas em ascensão para aqueles que visam potencializar resultados, absorver todos os dados existentes e mitigar riscos com o encontro perfeito entre máquinas e equipes multidisciplinares.

No entanto, a busca por esse talento tão especializado, identificado por muitos como um cientista de dados, é considerada uma das grandes barreiras para a adoção de inteligência artificial (IA) nas companhias, segundo relata a pesquisa Inteligência Artificial em Empresas Latino-Americanas – uma Visão Geral da Adoção e Tendências da Região. Realizado pela everis, o levantamento contou com a participação de mais de 40 diretores e cem executivos que lideram a adoção de IA em suas empresas, todas com mais de mil empregados e receitas maiores que US$ 100 milhões.

O talento especializado

Quando questionados sobre os principais desafios e dificuldades encontradas na adoção da IA nas organizações, os entrevistados pela everis destacam três itens fundamentais: a falta de uma estratégia clara de IA, a falta de orçamento destinado a esses projetos e a falta de talento com as habilidades necessárias para trabalhos relacionados à tecnologia. Para resolver esse último ponto, o recrutamento de profissionais especializados é crucial, embora pareça uma busca quase impossível.

Por serem desenvolvimentos de alta complexidade, os projetos de IA necessitam de equipes compostas por trabalhadores com conhecimentos em codificação, matemática, arquitetura de dados, estatística, engenharia de sistemas, análise de riscos, pensamento crítico, entre outras habilidades.

Essa reunião de competências faz sentido quando se espera um volume global de dados de 175 zettabytes até 2025, conforme aponta a International Data Corporation (IDC). A corporação estima também que haverá 41,6 bilhões de dispositivos conectados à internet das coisas até lá.

Contudo, hard skills como essas não estão sozinhas entre os critérios desejados pelas empresas. Espera-se ainda que esses talentos, além de superespecializados em tecnologia, tenham grande familiaridade com os objetivos do negócio e saibam se comunicar com clareza aos líderes.

“É nesse momento que, ao olharmos para o todo, é muito difícil encontrar todas essas características em uma só pessoa. Por isso, a solução tem sido montar equipes híbridas, combinando as capacidades técnicas às habilidades daqueles que conhecem profundamente o negócio, os serviços, os produtos”, afirma Daniela Griecco, diretora de data & analytics na everis.

Ainda segundo Daniela, “mesmo quando falamos de projetos mais simples de ação de IA, como predição e machine learning, até casos mais complexos como os de deep learning, que envolvem visão computacional e conhecimento em redes neurais, é importante saber traduzir como que todas essas adoções trarão valor ao negócio. E isso exige que o profissional saiba ter o discernimento adequado para se comunicar e mostrar quão essencial aquele investimento é. Portanto, estamos falando da capacidade de traduzir a linguagem técnica em requisitos de negócios e vice-versa”.

Como amostra da alta demanda por esse profissional, um levantamento divulgado pelo LinkedIn mostrou que a procura pelo cargo de especialista em IA aumentou cerca de 73% em 2019. De acordo com a pesquisa da everis, a demanda pelo desenvolvimento e otimização de algoritmos e redes neurais é muito maior do que a oferta disponível no mercado em todos os países da América Latina. 

Desenvolvimento e retenção do talento

Diante da alta demanda, as empresas fazem tudo que podem para conquistar esses profissionais – escassos e altamente competitivos – e, posteriormente, retê-los em suas estruturas organizacionais, especialmente porque os projetos de IA precisam de avaliações constantes. Outra opção é a de investimento no desenvolvimento desses trabalhadores em casa, o que também ordena profissionais tão capacitados quanto para tocar a “criação” desse perfil.

A partir disso, a everis perguntou aos líderes qual era o processo escolhido em suas companhias para a criação dos projetos de IA: 39% das empresas afirmaram desenvolver suas equipes internamente, 26% optaram por atrair talentos externos e 23% falaram que costumam contratar consultores externos.

No caso do apoio dado por consultores externos para os projetos de IA nas companhias, Daniela Griecco conta que muitas vezes as equipes são formadas de maneira a unir aqueles que são conhecedores profundos da tecnologia aos consultores que entendem os objetivos do cliente e possuem clareza sobre os impactos daquela adoção, fazendo com que esse compartilhamento de competências entre os perfis seja benéfica a todos. Como metodologia principal, a agilidade é indispensável na implementação dos processos.

“É comum ouvirmos que a IA substituirá os postos de trabalho nas empresas, mas essa é uma falácia. A experiência humana na jornada de adoção da IA faz toda a diferença, pois é o ser humano quem faz a recalibragem da máquina para o aprendizado e aplica sua capacidade analítica para promover resultados reais aos negócios. Portanto, nossa função é, para além de desenvolver o projeto, também apresentar um modelo consultivo e até mesmo de desenvolvimento do próprio cliente em questão de tecnologia. O capital intelectual é que tem o poder de transformar os negócios, ser estratégico, enquanto a IA pode assumir o que pode ser automatizado”, relata.

Por outro lado, quando há o talento dentro de casa, sua retenção é considerada um desafio para as lideranças, uma vez que, por ser escasso, esse é um tipo de profissional extremamente competitivo e que espera uma postura diferenciada das organizações. Geralmente, isso se traduz em esquema de remuneração e fidelização diferentes da estrutura tradicional proposta pelas áreas de gestão de pessoas.

“Além de exigirem uma remuneração alta, visto que são poucos os que reúnem todas essas competências, esses talentos esperam também um ambiente de alta inovação e que os desafie constantemente. O problema é que muitas das companhias possuem apenas silos de inovação e não uma cultura corporativa baseada em inovação, o que termina por desmotivá-los”, pondera Daniela.

Criação do ecossistema de talentos

Uma vez que a escassez de profissionais de IA ainda é um problema para todos os países da América Latina – e até fora daqui –, Daniela Griecco defende que a principal forma de atacar esse desafio está na criação de um ecossistema de talentos. Assim, é possível articular uma rede de conhecimento necessária para a empresa e para o profissional.

“É claro que isso também remete à uma outra questão que temos no Brasil e na América Latina especificamente, que é a formação acadêmica. Ainda há uma distância entre o mercado e a academia. As disciplinas de negócios, de inovação e de ideação estão bem mais presentes nas escolas de tecnologia e de negócios, mas a composição de suas grades acadêmicas continua ainda muito técnica. A formação nas instituições precisa preparar os profissionais para encarar a mudança da tecnologia e os impactos no dia a dia de suas futuras funções”, afirma.

Para isso, Daniela defende que as organizações trabalhem lado a lado com parceiros do mercado, fornecedores de tecnologia, centros de pesquisa, startups e universidades para impulsionar o conhecimento da IA para além dos desejos individuais.

Simultaneamente, a diretora de data & analytics da everis acredita que o apoio da liderança não pode ser deixado de lado, especialmente na questão do desenvolvimento desses talentos em casa. “Os altos líderes das grandes corporações precisam reconhecer cada vez mais a necessidade de se investir em IA, principalmente no que se refere a formação e capacitação de seus talentos. Formar profissionais incríveis dentro das empresas é muito melhor porque assim é possível multiplicar e extrapolar competências, fazendo com que o retorno desse investimento venha naturalmente”, emenda.

Confira mais artigos sobre inteligência artificial nos Fóruns MIT Sloan Review.”

Angela Miguel
Angela Miguel é editora de conteúdos customizados na Qura Editora para as revistas MIT Sloan Management Review Brasil e HSM Management.

Deixe um comentário

Você atualizou a sua lista de conteúdos favoritos. Ver conteúdos
aqui