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Tokenização, CBDCs e DLTs: o trinômio que vai revolucionar os modelos de pagamentos

De acordo com o World Payments Report 2022, essas tecnologias estarão na mira das PMEs nos próximos anos

Daniel Sanes

17 de Fevereiro

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Artigo Tokenização, CBDCs e DLTs: o trinômio que vai revolucionar os modelos de pagamentos

A última década foi de mudanças significativas no mercado financeiro. Mas a chave virou de vez a partir da pandemia de covid-19, que provocou uma verdadeira disrupção no modelo de pagamentos. Das criptomoedas ao brasileiríssimo Pix, as tecnologias reforçam uma tendência que já vinha se desenhando há algum tempo: num futuro próximo, dinheiro vivo será peça de museu.

De acordo com o World Payments Report 2022, que antecipa os próximos movimentos do setor, o share de transações não monetárias deve saltar de 17%, em 2021, para 28%, em 2026. Elaborado pela Capgemini, o relatório também aborda a importância crescente da cadeia de valor de pagamentos B2B e das pequenas e médias empresas (PMEs).

Mesmo representando um mercado global de US$ 850 bilhões, o segmento de PMEs não se sente plenamente atendido pelas instituições financeiras tradicionais. Segundo a pesquisa, 89% das pequenas e médias empresas esperam “reconsiderar” o relacionamento com seus bancos em várias categorias de produtos.

O relatório vislumbra uma oportunidade para novos players de pagamentos capturarem este mercado em expansão. Aos bancos incumbentes, fica o alerta: é preciso oferecer uma melhor proposta de valor para não perder clientes. No relatório, a Capgemini ainda destaca algumas tendências para os próximos anos: a tokenização de ativos, as DLTs e as CBDCs. A seguir, a MIT Sloan Review Brasil mostra como – e por que – essas novas tecnologias irão revolucionar o setor financeiro.

O promissor mercado dos tokens

O termo tokenização se popularizou bastante no mundo digital e no mercado em 2022. Na esfera econômica, chamou a atenção pelas cifras expressivas que vêm movimentando. Um estudo da Grand View Research projeta que o segmento crescerá a uma velocidade de 24% ao ano, fechando a década na casa dos US$ 13,5 bilhões.

Sob o aspecto técnico, trata-se de um processo que consiste em transformar bens ou produtos físicos em ativos digitais, os tokens, por meio da tecnologia blockchain – uma estrutura de blocos em que os usuários podem adicionar mais blocos e assim validar as transações na rede. Por meio de uma série de códigos e regras de identificação, a tokenização permite a compra e venda desse ativo, ou de partes dele (como uma fração de uma obra de arte, por exemplo). “Com o processo de tokenização, o ativo físico recebeu um certificado, uma autenticidade digital, o que neste ecossistema significa muito, pois passa a ficar registrado em uma plataforma digital”, destaca Lucio Pegasano, vice-presidente da Capgemini.

Daniela Dutra, líder de soluções para bancos da Capgemini, ressalta que a tokenização preserva a propriedade desses ativos para que possam ser negociados com eficiência e rapidez, sem o uso de intermediários. “Nesse cenário de mudança, o uso das carteiras digitais se torna extremamente relevante para a realização da custódia e realização de transações”, opina.

Para o superintendente executivo de pesquisa e inovação do Bradesco, Fernando Freitas, a nova tecnologia ainda está no “campo das hipóteses”, mas algumas vantagens já podem ser percebidas. “Uma delas é que o controle do ciclo de vida de um determinado ativo fica muito mais fácil. Além disso, utilizando uma estrutura em blockchain, a cadeia de valor pode ser reduzida. Quando olhamos para a tokenização, o fazemos sob dois prismas: o de maior eficiência e de mais agilidade na experiência do cliente.”

DLTs proporcionam segurança e transparência

O blockchain, que viabiliza o processo de tokenização, é uma espécie de DLT (sigla para distributed ledger technology, ou tecnologia para livro-razão distribuído). A tecnologia de DLT é um banco de dados com informações sincronizadas e espalhadas em um ecossistema ou rede. Como não possui um servidor central de armazenamento, seus arquivos podem ser verificados por qualquer usuário autorizado, pois existem cópias das informações em cada um dos nós da rede, todas com registro temporal e assinatura criptografada exclusiva. Pegasano destaca que tanto o blockchain como a DLT são tecnologias de registro distribuídas e ambas permitem realizar transações entre duas partes, sem intermediários. O executivo também aponta as diferenças entre elas:

  • Blockchain funciona como uma red ou cadeia de blocos interligados (sequencialidade) por uma assinatura criptografada (hash) os quais não podem mais ser alterados. Cada bloco seguinte se abre com essa chave criptografada garantindo a autenticidade.
  • DLT é um banco digital (também distribuído) onde as informações são copiadas, compartilhadas e sincronizadas (depois de chegar a um consenso entre os nós). Ou seja, as informações são espalhadas (e sincronizadas) entre os nós da rede que mantém o registro de todas as transações. Estas informações podem ser consultadas pelos atores da rede.
  • Blockchain geralmente é público e todos podem consultar as informações, participar nas operações ou se tornar um nó da rede.
  • As DLTs são mais restritas, havendo restrições sobre quem pode acessá-las, consultá-las e quem pode operar como um nó. Neste caso, normalmente a governança é deixada para uma única entidade ou, no máximo, para um conjunto limitado de atores.

Em relação à abordagem que as empresas de pagamento podem considerar para a utilização de uma DLT, Dutra reforça a estratégia sugerida pelo relatório da Capgemini: preparar, participar e buscar. Para executá-la, os incumbentes devem avaliar sua capacidade de assumir riscos e inovar, assim como os recursos que podem mobilizar, com base em seu tamanho e maturidade no mercado.

  • Preparar: foco na montagem da infraestrutura para a construção da fundação. Concentra-se na construção de uma rede de pagamento baseada em DLT.
  • Participar: grupos de bancos constroem casos de uso da indústria em moedas estáveis regulamentadas (CBDCs). As principais instituições financeiras estão em colaboração com o Banco Central, associações do setor e empresas de tecnologia para construir um consórcio.
  • Buscar: bancos com alta participação em DLT, têm infraestrutura e emitem seus próprios tokens/moedas para construir seu nicho.

CBDCs: vem aí o real digital

Em 2021, o Banco Central do Brasil anunciou as diretrizes gerais para o lançamento de uma moeda digital. Além de aumentar a eficiência no sistema de pagamentos de varejo, o objetivo de desenvolver uma CBDC (sigla em inglês para central bank digital currency, ou moeda digital do Banco Central) é contribuir para o surgimento de novos modelos de negócio e favorecer a participação do País no cenário econômico internacional, aumentando a eficiência nas transações transfronteiriças. “Essa moeda digital pode ser destinada ao público varejista – que hoje tem acesso ao papel-moeda, ou ao segmento de atacado para ser utilizada entre transações de instituições financeiras (como hoje são as reservas bancárias). Isso caberá a cada Banco Central decidir”, comenta Lucio.

Freitas explica que, por serem emitidas pelos governos, as CBDCs são consideradas uma reserva de valor. Além disso, surgiram como uma reação às criptomoedas privadas. “Os bancos centrais de todo o mundo ficaram receosos em perder o controle da moeda, o que, sob a perspectiva que temos hoje da macroeconomia, seria muito prejudicial”, diz.

Diferentemente das criptomoedas, que são mais voláteis, as CBDCs podem ser usadas em operações financeiras cotidianas. No caso do Brasil, em que o Pix caiu nas graças da população, o projeto de um real digital, com o mesmo valor do dinheiro físico, precisará ter um diferencial.

“Poderão ser emitidas stablecoins (moedas de valor estável, com baixíssima volatilidade) sob os depósitos com a garantia da CBDC, sem trazer muita complexidade para adaptação dos sistemas legados dos bancos. O objetivo é permitir que o mercado explore mais oportunidades com o uso de protocolos de DeFi (finanças descentralizadas)”, afirma Dutra.

Conforme o cronograma divulgado pelo Banco Central, a expectativa é que o real digital tenha pilotos ao longo deste ano, com o lançamento oficial ocorrendo entre o fim de 2024 e o início de 2025.

Protagonismo do cliente e amadurecimento da indústria

Embora o cenário seja relativamente novo, os especialistas são unânimes: as novas tecnologias colocarão os clientes no centro das ações. Dutra também enaltece o protagonismo do cliente, que terá a oportunidade de montar um portfólio de serviços e produtos. “Com a descentralização das finanças, ele pode escolher um empréstimo de um investidor, um cartão de crédito de um banco, um seguro de uma insurtech…”, exemplifica. “Isso aumenta a concorrência, reduz custos com burocracias e democratiza o acesso ao mercado financeiro”.

Além disso, Lucio da Capgemini ressalta que os incumbentes podem aproveitar a tendência no aumento constante no uso de blockchains, DLTs e CBDCs para se aproximar de pequenas e médias empresas que se sentem negligenciadas pelas entidades do mercado financeiro, geralmente mais focadas em grandes companhias. “As PMEs são uma parte muito importante no mundo inteiro e são grandes empregadoras. Se os bancos incumbentes realinharem os serviços e produtos para este setor, aproveitando a tecnologia DLT e permitindo às PMEs oferecerem melhores meios de pagamento, melhor liquidez, além de aprimorar seu fluxo de caixa, certamente terão suas receitas ampliadas. É um nicho que já é bem explorado pelos Provedores de Serviços de Pagamento (PSPs) e que os incumbentes não podem deixar de lado”, aponta.

Da mesma forma que há oportunidades, também há alguns desafios a serem superados. Os principais deles estão relacionados a ciberataques, políticas regulatórias, auditoria, infraestrutura fragmentada e privacidade dos dados. Em relação à segurança cibernética, o executivo do Bradesco comenta que há algumas vulnerabilidades. “Quando pensamos em blockchain e aplicações DeFi, por exemplo, o código-fonte fica exposto para os hackers. O blockchain é seguro, mas as aplicações feitas em cima dele, não necessariamente o são”, analisa.

Para ele, é preciso que a indústria entenda como serão criados os certificados para os códigos dos smart contracts (sistemas de contratos utilizados para executar transações de forma automática). Mesmo assim, Freitas salienta que os benefícios superam as eventuais desvantagens. “Acreditamos muito nessa tecnologia. Nos próximos cinco a dez anos ela deve modificar a infraestrutura do setor financeiro e a estrutura de algumas cadeias”, finaliza.

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Daniel Sanes

Daniel Sanes é colaborador de MIT Sloan Review Brasil.

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