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Quer evitar a paranoia da produtividade? Construa uma cultura de honestidade

A falta de confiança entre colegas e na relação com os gestores prejudica a moral e afeta a cultura da organização, particularmente no trabalho remoto ou híbrido

Pamela Meyer
12 de julho de 2024
Quer evitar a paranoia da produtividade? Construa uma cultura de honestidade
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Era inevitável que o trabalho remoto produzisse novos tipos de tensões entre os trabalhadores e nas organizações, mas também não precisava ser tão ruim. Segundo uma pesquisa da Envoy, menos de um quarto das pessoas, isto é, 24% confiam que seus colegas farão seu trabalho fora do ambiente da empresa. Um dos motivos, de acordo com a Envoy, pode ser a “paranoia da produtividade”. A expressão foi cunhada pela Microsoft como uma situação de trabalho híbrido ou remoto, em que “os gestores temem a queda da produtividade porque as pessoas não irão trabalhar, ainda que o número de horas à disposição, quantidade de reuniões e outras métricas tenham subido”. É possível que os funcionários percebam esse temor em seus gestores e o estendam a si mesmos.

A falta de confiança tem mão dupla. Os gestores se queixam que não conseguem monitorar os subordinados trabalhando de casa. Do outro lado, os funcionários remotos acham que os colegas que trabalham presencialmente podem se valer do contato físico para ter maior proximidade com as chefias, com mais chances de aumentos e promoções.

A pesquisa mostra que a desconfiança prejudica o ambiente de trabalho, enquanto a confiança produz motivação e engajamento e reduz absenteísmo. Ao longo dos anos que passei oferecendo treinamento para as organizações identificarem o que é falso e trazer a verdade à tona, ajudei empresas a desenvolverem culturas que cultivam confiança e honestidade em um círculo virtuoso: quanto mais honesto e aberto é um ambiente, mais confiáveis e produtivos serão os que fazem parte dele. Desde o começo da pandemia, há três anos, venho observando o que as organizações precisam fazer para construir um novo caminho neste mundo que surgiu. Aqui estão quatro passos que qualquer gestor pode adotar para aumentar a confiança e honestidade de um ambiente, seja ele remoto ou híbrido.

1 – Conheça o ambiente em que os indivíduos se inserem

Trabalhadores remotos são, em geral, tratados como se fossem todos iguais, mas isso não corresponde à realidade. Alguns são mais proativos e independentes ao planejar suas atividades e se mostram confortáveis não apenas comunicando-se com suas chefias, mas às vezes até exagerando para mantê-las atualizadas. Outros sofrem com a ausência de colegas e superiores ou têm dificuldade em se concentrar pela presença de familiares ou outros moradores com quem dividem seu espaço.

A prioridade do gestor deve ser descobrir como cada funcionário pode dar o seu melhor. Ao longo do ano, em intervalos regulares, verifique como estão se saindo em seu ambiente e se há alguma mudança a ser feita. Se estiver contratando alguém que já trabalhou de casa antes e manifesta interesse em continuar a fazer isso, pergunte se e como dava certo. E quando estiver recebendo novos funcionários, aproveite para esclarecer suas expectativas sobre o trabalho, seja no esquema presencial ou remoto, assim como da carga horária e da disponibilidade. Quando um gestor deixa claro o que espera de sua equipe, esta tende a confiar mais nele e no trabalho dos demais colegas.

2 – Incentive muitas interações entre as pessoas

As pessoas costumam se conectar aos outros pessoalmente, e essas conexões produzem confiança. Um estudo de 2022 apontou que reuniões virtuais não têm a mesma dinâmica das presenciais, como a oportunidade de observar seus olhares, linguagem corporal, o gestual, as conversas paralelas e a interação social.

As empresas precisam facilitar mais contatos entre funcionários, do tipo que se aproxima daqueles ao vivo, para que desenvolvam essa mesma relação de confiança. Tudo isso exige que todos estejam nas mesmas condições de uso das tecnologias de trabalho remoto. Muitos não irão admitir que não sabem criar uma sala de conversa ou uma pesquisa, por exemplo. Faça uma lista dos conhecimentos necessários e garanta que todos estejam na mesma página. Em alguns casos, será preciso que o empregador invista em equipamentos para serem usados em casa.

Além disso, não desconsidere as ligações telefônicas. Um grupo de pesquisadores publicou recentemente que, em conversas 1-on-1 (um-a-um) por áudio, as pessoas ”identificam sinais pelo tom da voz, pelo volume, o que ajuda na sensação de segurança e confiabilidade”, uma sensação calorosa.

3 – Monitore, e seja transparente ao fazê-lo

Há uma estimativa de que 80% dos empregadores usam um software de monitoramento para acompanhar a produtividade de seus funcionários. É um tipo de ferramenta que suscita questionamentos éticos e pode ser um tiro pela culatra, aumentando o stress e prejudicando o rendimento.

Mas eu acredito que a solução não é deixar de monitorar, mas sim agir com a mesma honestidade que se espera das equipes. Em uma pesquisa do Gartner Group, espantosos 41% dos entrevistados disseram que não haviam sido comunicados sobre essa coleta de dados, quais seriam, porquê, e para quê. Isso precisa acabar. Quando as empresas são sinceras sobre como e porquê acompanham o trabalho, remoto ou presencial, os funcionários se sentem melhor uns com os outros. Veem que o empregador observa a qualidade de ambos os grupos, afastando a ideia de que seu trabalho não seja reconhecido.

4 – Treine os funcionários para se defenderem da falsidade

As empresas têm ainda que lidar com um fator que está fora de seu controle: as notícias sobre práticas desonestas nas organizações, sejam de políticos ou altos executivos, geram desconfiança entre os funcionários. Eles, naturalmente, querem se proteger contra pessoas falsas em seu ambiente.

Quando estou treinando equipes, ensino técnicas específicas para identificação de padrões fraudulentos e indicando a honestidade como prática. Por exemplo, mostro como introduzir questionamentos de uma maneira a neutralizar respostas emocionais, para que as pessoas simplesmente apresentem fatos, em lugar de se posicionarem defensivamente ou tentarem disfarçar. Ensino também a observar o quanto outros tentam desviar de um determinado assunto e notar mudanças sutis em expressões faciais ou linguagem corporal.

Um dos maiores benefícios deste aprendizado é a desmistificação. As pessoas passam a crer em sua capacidade de localizar tentativas de enganá-las e se sentem menos vulneráveis que alguém lance uma cortina de fumaça diante de seus olhos.

Quando as organizações seguem essas orientações, constroem uma cultura de confiança, fazendo com que as chances de paranoia sejam menos prováveis. Oferecem uma experiência melhor, mais produtiva e que gera maior satisfação aos seus funcionários, sem que o seu local de trabalho faça qualquer diferença.”

Pamela Meyer
Pamela Meyer é autora de *Liespotting: Proven Techniques to Detect Deception* e é CEO da Calibrate, consultoria especializada em detecção de fraudes e ameaças internas. Sua apresentação *How to Spot a Liar*, de 2011, é um dos 20 TED Talks mais assistidos até hoje.

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