O empreendedorismo inovador não para no Brasil: saiba como nasceu o Natchup, um ketchup rico em vitamina C e desprovido de conservantes que foi desenvolvido dentro da Universidade Federal do Ceará e está na mesa de um número crescente de pessoas
Como desenvolver um produto inovador que atenda às demandas de salubridade e utilize riquezas da flora nordestina brasileira?
Essa foi a pergunta que Lucicléia Barros, professora da Universidade Federal do Ceará (UFC), levou para seus alunos e alunas do curso de engenharia de alimentos. Os estudantes, desafiados pela professora, criaram o Natchup, um ketchup natural, rico em vitamina C e desprovido de conservantes, à base de acerola, abóbora e beterraba. O produto foi concebido para atender ao público jovem, que poderia consumi-lo como um molho saudável para diversos tipos de alimentos.
Os insumos básicos – acerola, abóbora e beterraba – podem ser cultivados de maneira orgânica e substituem o tomate, que costumeiramente é exposto a quantidades consideráveis de aditivos e defensivos agrícolas durante o seu cultivo.
O resultado foi um sucesso. Os inventores ganharam reconhecimento por desenvolverem um produto inovador (o Sial Innovation 2018) e hoje o Natchup já está na mesa de milhares de pessoas.
Até alcançar a indústria e a mesa dos consumidores, o processo de inovação não foi simples. Logo após a concepção durante a disciplina na UFC, o projeto foi financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) por meio do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC).
Nessa etapa foram realizados diversos testes laboratoriais e experimentos científicos para o desenvolvimento do produto. O teor de açúcar e sódio foi ajustado e as características sensoriais do Natchup foram aprimoradas para atender às expectativas do mercado consumidor.
Também foram necessários testes microbiológicos e de viscosidade, passando pelo projeto (design) da embalagem ideal e definição do tempo de prateleira. O produto passou por mais de 20 formulações.
Com esses resultados em mãos, os inventores depositaram a patente de invenção do molho, seguindo as normas de proteção de propriedade intelectual da UFC.
Para colocar sua visão empreendedora em prática, Lucicléia mobilizou a Federação de Indústrias do Ceará (FIEC), a fim de apresentar as pesquisas desenvolvidas no curso de engenharia de alimentos da UFC para as empresas do setor de alimentos. Pela FIEC, conheceu a diretora da empresa Frutã e lhe apresentou o Natchup. A empresária gostou do produto, entendeu que se adequava à linha estratégica de sua companhia e já no dia seguinte marcaram uma visita à fábrica.
Essa interação culminou na parceria da Frutã com a UFC. Com base no recentemente atualizado Marco Legal da Inovação, que estimula a transferência de tecnologia da universidade para o meio empresarial, foi celebrado contrato de licenciamento exclusivo da patente do Natchup para a Frutã.
Esse foi o primeiro caso de licenciamento de uma patente da UFC e gerou aprendizado para todos os envolvidos, criando processos e pavimentando um caminho para a Universidade transferir o seu conhecimento e, assim, contribuir para o avanço da inovação em nosso País.
A Frutã agregou visão industrial ao produto e desenvolveu a estratégia de entrada nos mercados nacional e estrangeiro. Atualmente são produzidas 1.500 unidades de Natchup por dia. Parte do resultado econômico das vendas retorna para a Universidade, que a reparte com os inventores, conforme estabelece o referido Marco Legal da Inovação.
Motivados por um desafio acadêmico posto por uma professora inspiradora e empreendedora, estudantes desenvolveram uma tecnologia que gerou novo conhecimento. Combinando-o com a disposição de uma empresa em inovar, foi possível desenvolver um produto que contribui para a saúde dos consumidores, enseja a geração de valor econômico pela biodiversidade brasileira e, assim, promove o desenvolvimento socioeconômico.
O caso Natchup é mais uma ilustração da inovação gerada pela cooperação entre academia, indústria e governo. Aplica-se ao processo de inovação o ditado popular “uma andorinha não faz verão”. Pois são vários os agentes no sucesso de um produto inovador. No caso Natchup, há uma Universidade disposta a extrapolar os seus limites, para estender à sociedade ampla o conhecimento ali produzido.
Relevante é também o papel do governo, que tem papel essencial no financiamento da formação de novos cientistas. Imprescindível é uma liderança industrial visionária, que investe e toma riscos na inovação de base científica, para adquirir vantagem competitiva.
Quer saber mais sobre essa inovação? Ouça a entrevista da Lucicléia Barros, professora da UFC e inventora do Natchup, no podcast Inovação com Ciência.”