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Lições de inovação ultrarrápida vindas da pandemia

Empresas de todos os tipos estão aprendendo com as farmas a acelerar a inovação redirecionando conhecimentos, recursos e tecnologias

Por Georg Von Krogh, Burcu Kucukkeles e Shiko M. Ben-Menahem
30 de julho de 2024
Lições de inovação ultrarrápida vindas da pandemia
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Apandemia do coronavírus é um dos desafios mais difíceis que a humanidade já enfrentou – ao menos desde a última guerra mundial. Enquanto lutam para descobrir tratamentos e vacinas, organizações e especialistas também estão redefinindo a inovação.

Na indústria farmacêutica, a abordagem convencional à inovação se dá por um processo demorado, que começa com a descoberta e a geração de possíveis compostos de drogas e passa por uma fase meticulosa de refinamento e seleção, visando ao desenvolvimento gradual, testes clínicos e licenciamento comercial. Embora esse modelo continue sendo o mais eficiente no desenvolvimento de medicamentos, a demanda urgente por inovação está provocando o redirecionamento de ideias, conhecimentos e tecnologias já disponíveis. Embora seja comum na indústria farmacêutica, o redirecionamento se tornou a pedra angular da inovação também em outros segmentos forçados a lidar de maneira urgente com a crise pandêmica.

A chave é redirecionar

Destilarias de rum e uísque começaram a produzir álcool em gel e sanitizantes. Fabricantes de cosméticos como Nivea, L’Oréal e LVMH lançaram desinfetantes para as mãos. A fabricante de eletrodomésticos Dyson está usando sua tecnologia de compressão de ar para desenvolver respiradores. Jeff Bezos e Elon Musk redirecionaram a capacidade de fabricação e a experiência de suas respectivas companhias espaciais, a Blue Origin e a SpaceX, para imprimir protetores faciais em 3D destinados a profissionais de saúde.

A lógica de redirecionamento, que é subjacente a todas essas iniciativas, pode ser resumida em cinco princípios:- compreender o problema;- mapear recursos;- usar tecnologias emergentes;- incentivar a colaboração- integrar os usuários finais.

1. Compreenda o problema a resolver. Tudo começa por avaliar e entender rapidamente o problema que a inovação deve resolver. Isso é essencial para enfrentar o desafio com os recursos, ideias, conhecimentos e tecnologia existentes. Olhar para a tecnologia disponível como uma potencial solução pode também proporcionar uma nova percepção do problema. Se, por exemplo, o seu objetivo é impedir que as pessoas sejam infectadas, você precisa obter o máximo possível de informações sobre o vírus – seu DNA, sua reprodução e seu processo de transmissão. Observe que o conhecimento mais valioso sobre o desafio a enfrentar pode ter origem fora da empresa.

2. Faça um rápido inventário de seus conhecimentos e recursos. Para que o redirecionamento funcione, você precisa desenvolver rapidamente um inventário de “coisas úteis”, como produtos, instalações, bancos de dados, software, talentos e experiência. Como a incerteza e a urgência são grandes, o redirecionamento é mais bem-sucedido quando as empresas recorrem a recursos e conhecimentos que já estão disponíveis, alguns dos quais chegam a ser vistos como efeitos indesejáveis ou subprodutos pouco atrativos. É comum que, para certas doenças, sejam prescritos medicamentos “off-label”, desenvolvidos para outros fins, mas cuja eficiência é vista até de maneira fantasiosa, em geral por falta de tratamento alternativo. Foi assim que a FDA [a Anvisa dos Estados Unidos], ante a escassez de terapias opcionais, aprovou a prescrição de cloroquina para Covid-19 mesmo com pouca evidência de seus benefícios. Outros exemplos recentes de redirecionamento incluem o Hospitainer – organização que transforma contêineres em módulos hospitalares de emergência que podem ser despachados para áreas de crise – e a L’Oréal, que reformou suas instalações para fabricar desinfetante para as mãos. Embora o processo de produção do desinfetante seja relativamente simples, o emprego de determinados recursos, como as instalações de fabricação higiênicada L’Oréal e a infraestrutura de envasamento, trouxe sinergia para a confecção do item.

Enxergar subprodutos de maneira criativa pode ser outra abordagem valiosa para o redirecionamento. Uma amostra vem dos laticínios, que nos últimos anos têm oferecido a consumidores preocupados com hábitos saudáveis produtos aprimorados com o soro do leite – antes considerado um subproduto indesejado da fabricação de queijos. Nesses casos, a complexidade de um produto e sua possibilidade de gerar novos atributos desempenham um papel importante na eficácia do redirecionamento. À medida que cresce a distância entre o desafio e o domínio do conhecimento existente, o controle do reposicionamento pode se tornar menos eficaz.

3. Use tecnologias emergentes. Computação em nuvem, análise de dados, inteligência artificial e outras tecnologias emergentes proporcionam dois benefícios para a inovação ultrarrápida. Primeiro, as plataformas digitais permitem que os principais atores, como usuários, especialistas, financiadores e empresas públicas e privadas compartilhem informações e criem conhecimento coletivamente.

As iniciativas da Organização Mundial da Saúde (OMS) para desenvolver uma vacina se baseiam em uma extensa comunidade online de especialistas de diversas organizações que, por meio de um trabalho planejado e coordenado, compartilham protocolos, insights e conhecimento baseados em pesquisas. Segundo, a combinação entre machine learning e big data pode identificar rapidamente vínculos promissores entre necessidades e soluções. Hoje, o redirecionamento de medicamentos se beneficia da biologia computacional e da automação, que permitem aos pesquisadores identificar remédios supostamente eficazes no tratamento de uma doença específica. Embora o uso da biologia computacional tenha limitações no campo da descoberta de novas drogas, ela é muito eficiente na identificação rápida de ideias viáveis.

É mais fácil encontrar possíveis combinações quando as informações sobre os problemas e os inventários de soluções estão disponíveis e compartilhados em plataformas digitais. Prova disso é a ferramenta de diagnóstico de Covid-19 desenvolvida em conjunto por Adventure, Momentum, Outlook e Alibaba Group. Baseada em inteligência artificial, a ferramenta pode detectar a doença em 20 segundos em tomografias analisadas por uma diretriz fornecida por um radiologista. Ela ajudou médicos de 26 hospitais da China a examinar rapidamente mais de 30 mil casos no auge do surto no país.

4. Incentive a colaboração aberta e interdisciplinar. Para entender com velocidade o desafio da inovação e identificar possíveis soluções, é crucial incentivar e apoiar a colaboração aberta e interdisciplinar. Esse movimento está ocorrendo na pandemia. Os filantropos Bill e Melinda Gates, junto a especialistas de sua fundação, têm atuado de maneira extremamente positiva nas respostas à crise. Embora seu apoio financeiro seja importante, mais decisivo ainda é o conhecimento que instituições como essa trazem à tona quando se trata de entender como orquestrar uma colaboração global e interdisciplinar.

Dada a urgência da situação, a disponibilidade e o apoio de executivos à comunidade global de pesquisadores e cientistas de empresas farmacêuticas têm sido fatores centrais de sucesso na busca por tratamentos para a Covid-19. À medida que as empresas abrem seus ativos internos, as oportunidades de redirecionamento para as comunidades científicas se multiplicam.

A colaboração coletiva é uma maneira bem conhecida de buscar respostas para uma crise, e vale tanto para testar água potável contaminada quanto para coordenar assistência a desastres. A ideia por trás do conceito é endereçar questões a especialistas além das fronteiras organizacionais e funcionais para que estes encontrem soluções alternativas. Ao lidar com a atual pandemia, as empresas podem lançar mão de chamadas públicas ou de maratonas de inovação para descobrir novas maneiras de tornar seus produtos, serviços e instalações disponíveis como soluções para crise.

Algumas “coronatonas” já surgiram. A Mobility Goes Additive, rede de empresas de impressão 3D, lançou o weboostam.com, uma plataforma online que compartilha com seus integrantes designs específicos para imprimir protetores faciais, máscarase abridores de portas que dispensam toque manual. Com espírito de abertura e colaboração, os executivos podem usar mecanismos semelhantes.

5. Integre rapidamente os usuários finais. Não é preciso aguardar pesquisas de mercado para identificar as demandas urgentes dos usuários finais e depois atendê-las por meio de inovação ultrarrápida. Você deve criar canais de comunicação que facilitem a esses usuários expressar suas necessidades, que devem ser trabalhadas velozmente pelos gestores no processo de inovação. Integrar o conhecimento dos pacientes é um fator-chave no enfrentamento de doenças, particularmente as que demandam inovação urgente.

Os relatos de pacientes sobre os sintomas das doenças, que eles costumam compartilhar livremente por meio de vídeos do YouTube ou pesquisas no Google, são fontes valiosas de aprendizado sobre as enfermidades e sua evolução. Portanto, são essenciais para gerar novas descobertas. Da mesma forma, os profissionais de saúde estão na vanguarda da inovação no que diz respeito aos dispositivos médicos durante a pandemia. Foi com colaboração de médicos do centro de saúde da Vanderbilt University que engenheiros da instituição desenvolveram um protótipo de respirador. Sem a participação desses profissionais, alguns recursos essenciais, como sensores de pressão e alarmes, poderiam ter sido deixados de lado. A integração dos profissionais de saúde e de pacientes ao processo de inovação foi crucial.

Mesmo no meio da atual pandemia, há razões para otimismo. As lições de inovação baseada no redirecionamento, aprendidas com as farmas, podem nos ajudar a todos a desenvolver novas soluções mais rapidamente – para os desafios atuais e os que estão por vir.”

Por Georg Von Krogh, Burcu Kucukkeles e Shiko M. Ben-Menahem
Georg von Krogh é professor de gestão estratégica e inovação da ETH Zurich, Suíça. Burcu Kucukkeles é professor de estratégia na Amsterdam Business School da University of Amsterdam, Holanda. Shiko M. Ben-Menahem é conferencista da ETH Zurich.

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