
Entenda por que a inovação precisa reencontrar sua essência para continuar relevante – e como as empresas líderes estão fazendo isso com foco em impacto real e valor entregue
“Aqueles que contam as histórias governam a sociedade.”
Essa frase, atribuída ao filósofo grego Platão (428 a.C. –347 a.C.), ilustra como as narrativas não são apenas reflexos do tempo, mas forças que moldam a forma como pensamos, decidimos e agimos.
Cada época tem suas histórias dominantes, seus mitos e máximas incontestáveis. Histórias não são apenas relatos do passado, elas moldam a forma como enxergamos o presente e definimos o futuro.
No mundo corporativo, a inovação tem sido uma dessas grandes narrativas, impulsionando investimentos, moldando estratégias e definindo carreiras.
Mas será que a história original de geração e captura de valor que embasou a busca incessante por inovação se manteve íntegra? Será que a narrativa mais recente da inovação, que acabou tão influenciada pelo hype das novas tecnologias e eventos, não acabou levando muitos executivos a enxergarem a prática da inovação como uma atividade periférica e desconectada de impacto real nos negócios?
O “zeitgeist”, espírito do tempo, mudou. O mercado amadureceu, os recursos estão mais escassos e o glamour cede espaço para uma busca pragmática por impacto real nos negócios. A nosso ver, a inovação precisa se reconectar com sua narrativa original para dialogar com as demandas atuais e garantir que continue sendo uma força transformadora, e não apenas um discurso sedutor.
Ao longo do tempo a visão original da inovação foi sendo dissipada. Ela passou a ser vendida como uma jornada épica: o surgimento da grande ideia, o momento “eureka” (a descoberta do grego Arquimedes na banheira de 216 a.C.), a disrupção pelo simples desejo da ruptura que transformaria mercados, ideias estas inspiradas em práticas de algum lugar mágico em terras distantes, talvez no Vale do Silício, que se replicadas, levariam a resultados extraordinários. No entanto, na prática, a inovação que realmente move as empresas raramente acontece assim.
A vantagem competitiva emerge da capacidade de execução sistemática de um portfólio de projetos inovadores alinhados à estratégia e com compromisso inabalável de ampliar o valor entregue para os clientes e para a sociedade. Empresas bem-sucedidas não são necessariamente as que têm mais ideias jamais pensadas, mas as que conseguem implantá-las de maneira consistente e sustentável. Para avançarmos, precisamos substituir algumas das máximas recentes da inovação por princípios mais alinhados à sua visão original, e à realidade atual do mercado.
A narrativa original se percebe presente, para o bem dos negócios e da inovação, em empresas estabelecidas. A análise dos últimos cinco anos do ranking figuraram em pelo menos dois dos cinco anos entre as dez mais inovadoras. São elas: Einstein, Embraer, Weg, Petrobras, CNH, Natura, Vale, Meli, Bosch, Nestlé, IBM, Suzano e Boticário.
Essas empresas navegaram num cenário de maior abundância e seguem inovando no atual contexto de maior escassez. O trabalho com algumas das empresas mais inovadoras do Brasil e a vivência executiva dentro de empresas globais nos permitiu identificar sete máximas que são, novamente, pertinentes:
O acadêmico norte-americano Walter Fisher (1931–2018) em sua teoria da narrativa, defende que os seres humanos são, antes de tudo, “seres narrativos”: tomamos decisões e damos sentido ao mundo por meio das histórias que contamos e acreditamos.
Se a inovação quer continuar sendo uma força de transformação, precisamos voltar às origens e retomar a essência do que é inovar. A Era do espetáculo foi uma fase na jornada de amadurecimento da inovação corporativa. Espetáculos são veículos para mover as emoções e trazer “awareness”.
Só que, depois dos espetáculos, vem a vida real: e essa precisa de consistência. Desde o trabalho seminal do cientista político austríaco Joseph Schumpeter (1883–1950), em 1937, a inovação trata de impacto, execução disciplinada e captura de valor. Essa é a narrativa original da inovação.
*O colunista escreveu este artigo em coautoria com Priscila Freitas, que é head de inovação da Nestlé Brasil.