
Como a escuta ativa, a empatia e a valorização da diversidade podem transformar uma trajetória de liderança
Minha trajetória tem sido marcada por muitos desafios, aprendizados e pela busca constante por desenvolvimento e aprimoramento. Porém, ao refletir sobre o legado que pretendo deixar para o mundo, reconheço que, além de exercer a liderança, é imprescindível estabelecer conexões, inspirar e promover transformações.
Para alcançar resultados sustentáveis e de impacto relevante, fundamento minha atuação na inteligência relacional — compreendida como a capacidade de desenvolver autoconsciência, estabelecer vínculos genuínos e promover um ambiente no qual todas as pessoas se sintam valorizadas, representadas e incentivados a contribuir para um propósito coletivo.
No início da minha trajetória profissional, enfrentei situações que me levaram a questionar por que a tecnologia ainda não era um espaço plenamente inclusivo e acessível a todos, especialmente às mulheres. Durante a graduação em Sistemas de Informação, em uma turma predominantemente masculina — com apenas 10% de mulheres —, desenvolvi a habilidade de me conectar e estabelecer relações com pessoas de diferentes formações, culturas e experiências, valorizando a diversidade de perspectivas.
Esse período me fez refletir sobre a forma com que eu me relacionava com os outros, em especial no que se referia ao poder de adaptação e à importância de ser flexível. Sem dúvida, também me proporcionou a convivência com pessoas excepcionais, que continuo a admirar profundamente, e com as quais aprendi lições valiosas.
Dentre as motivações e inspirações dessa época, posso afirmar que saí ainda mais convicta da importância da representatividade feminina e da urgência de promover valores essenciais, como a igualdade e o respeito.
Com o tempo, compreendi, ainda, que minha força reside tanto na capacidade de me adaptar às diferentes situações quanto no autoconhecimento. Pois, ao defender e preservar valores que são essenciais para mim, construo uma liderança autêntica, capaz de inspirar confiança e gerar um impacto positivo no longo prazo.
Hoje, quase 20 anos depois, lidero uma equipe diversificada e multicultural na área de inovação digital. Cada membro traz consigo uma história única — e meu papel é unir essas diferenças em torno de um objetivo comum. A gestão de equipes remotas, com pessoas presentes não só no Brasil como também em diferentes países, traz uma camada adicional de complexidade — os fusos horários, as culturas distintas e os hábitos variados exigem uma comunicação mais clara e estratégias de gestão mais flexíveis. Além disso, o desafio do idioma, com equipes de diferentes nacionalidades, exige atenção extra para garantir que todos se compreendam plenamente, de forma que as barreiras linguísticas não interfiram na colaboração eficaz.
A confiança, portanto, tem sido um dos pilares mais importantes da minha liderança. E promover uma comunicação frequente, adaptada às realidades de cada um e com a garantia de que todos serão ouvidos e valorizados, é essencial para estabelecer essa confiança. Quando se constrói isso, a diversidade e a inclusão prosperam e a equipe fica mais engajada, criativa, que entrega resultados reais e tangíveis.
“Liderança é sobre construir um ecossistema de pessoas que, unidas pela confiança e pela colaboração, entreguem resultados sustentáveis.”
É essencial criar um ambiente acolhedor, onde a equipe se sinta à vontade para se expressar e colaborar de forma genuína. Além disso, incluir um toque de humor e leveza também ajuda a aproximar as pessoas. Um exemplo marcante na minha equipe foi a contratação de um colaborador surdo. Para garantir sua inclusão plena, tomei a decisão de aprender a Língua Brasileira de Sinais (Libras). Essa experiência foi extremamente enriquecedora e me ensinou a acolher minhas inseguranças, ao mesmo tempo em me ajudou a estabelecer conexões mais profundas e genuínas com todos os membros do time.
A verdade é que mostrar vulnerabilidade e adotar uma postura de parceria, no lugar de uma relação hierárquica rígida, fortalece muito as relações entre gestor e liderado. Essa abordagem cria um clima de confiança e facilita a comunicação genuína, essencial para um trabalho conjunto eficaz.
Outra ferramenta essencial em meu caminho de liderança tem sido a prática da escuta ativa. Focar genuinamente no que cada pessoa tem a dizer, sem distrações, transmite respeito e cria uma atmosfera de confiança. Durante a pandemia, essa habilidade se mostrou ainda mais relevante, pois a comunicação clara e empática foi fundamental para manter a equipe coesa e alinhada com os objetivos. Na prática organizacional, líderes podem incorporar essa prática promovendo sessões regulares de feedback, onde os colaboradores sejam ouvidos e suas preocupações tratadas com seriedade.
Promover outros momentos de diálogo aberto, como reuniões voltadas para o bem-estar emocional da equipe, contribuem para um ambiente de trabalho saudável e produtivo, o que reflete diretamente em resultados claros e sustentáveis.
Estruturar uma área de marketing digital, do zero, em uma farmacêutica multinacional brasileira durante a pandemia foi um desafio à parte. As competências técnicas não eram suficientes. Eu precisei me adaptar rapidamente às mudanças. Naquele cenário de grande incerteza, utilizei minha flexibilidade cognitiva para ajustar estratégias, ouvir diferentes pontos de vista e buscar soluções inovadoras. A comunicação não violenta se mostrou essencial para transmitir segurança e promover um ambiente no qual todos se sentissem parte do processo, mesmo nos momentos de maior adversidade.
Ao liderar em tempos de crise, aprendi que a abertura para novas perspectivas é crucial: questionar meus próprios conceitos e estar disposta a revisar meus posicionamentos para tomar decisões mais equilibradas. E acredito que essa postura também inspirou a minha equipe a adotar uma mentalidade de crescimento, a encarar os desafios como oportunidades de aprendizado e evolução.
Organizações podem aplicar esses princípios criando estruturas de trabalho mais flexíveis, que permitam respostas rápidas a mudanças. Além disso, promover uma cultura de aprendizado contínuo, onde os erros são vistos como uma parte natural do processo de inovação, ajuda a construir resiliência dentro dos times, gerando resultados que não apenas atendem às necessidades do presente, mas também preparam as equipes para desafios futuros.
Um momento muito gratificante em minha carreira foi quando atuei como mentora de uma jovem aprendiz. Ao auxiliá-la a identificar seus pontos fortes e encontrar um propósito profissional, aprendi a valorizar ainda mais a diversidade de perspectivas, o que só fortaleceu meu compromisso com a criação de um ambiente inclusivo.
Reconhecer e valorizar as diferenças culturais e individuais é fundamental para criar um senso de pertencimento organizacional. Quando isso é feito de maneira genuína, promove-se uma colaboração mais rica e criativa, essencial para o sucesso da equipe. A integração de pessoas com deficiência, por exemplo, enriquece a dinâmica do time e eleva o padrão de inclusão de toda a organização.
Como líder, acredito que um um ambiente que combine diversidade, aprendizado, colaboração e mentalidade aberta à mudança é um dos pilares da inovação. Respeitar as diferenças individuais e culturais não só enriquece o trabalho em equipe, mas também abre espaço para soluções criativas e transformadoras.
Para o futuro, meu plano é continuar liderando com empatia, em um ambiente inclusivo e adaptável, onde a diversidade seja o motor para a colaboração e o crescimento.
“A verdadeira liderança não está apenas no que conquistamos, mas na capacidade de inspirar outros a crescer ao nosso lado.”
Ao criar um espaço de confiança e respeito, pavimentamos o caminho para um futuro mais inclusivo, inovador e significativo. Meu objetivo é deixar um legado que vá além de números e métricas, mas que impacte vidas e contribua para um mundo onde a tecnologia, a saúde e a humanidade se conectem para promover mais qualidade de vida para todos.
Acredito que empresas que desejam adotar esse modelo de liderança devem começar criando missões claras, que conectem o trabalho diário com impacto significativo na sociedade. Isso não só engaja pessoas, mas também inspira lideranças no longo prazo.
*Artigo escrito por Laís Gurgel. Formada em tecnologia pela Universidade Mackenzie, administração pela FGV e com MBA Executivo pela FIA, Laís acumula mais de 15 anos de experiência em inovação digital, marketing e tecnologia e tem liderado iniciativas digitais globais na Eurofarma desde 2020.