Esses órgãos devem ter caráter estratégico, agregar capacidade crítica à organização e serem compostos, majoritariamente, por membros do conselho
As pessoas são o componente mais importante de uma empresa. Sem elas, não importa a tecnologia, os recursos financeiros, o produto e os serviços disponíveis; o negócio pode dar errado. Nesse sentido, garantir a boa relação entre os membros de uma equipe pode potencializar os resultados de uma companhia. Por isso, é cada vez mais frequente o uso de comitês de pessoas.
Ligado diretamente ao conselho de administração, o comitê atua para alinhar as estratégias de negócio de longo prazo e o engajamento das equipes. O objetivo é motivar talentos, garantir uma comunicação assertiva e preparar políticas de sucessão.
Segundo o estudo Comitê de Pessoas de Assessoramento ao Conselho: Orientações Práticas, do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), o número médio de comitês de assessoramento cresceu de 2,1 para 2,9 nas empresas da B3, entre 2015 e 2021. Os dados também apontaram que 61% das companhias listadas nos segmentos diferenciados da B3 apresentam comitês ligados às pessoas, cultura ou remuneração.
Além das companhias abertas, as evidências demonstram que empresas familiares com conselhos de administração também estão estruturando comitês. Para falar da importância dos comitês de pessoas e do crescimento do seu uso entre as principais companhias, conversamos com Marcelo Godinho, coordenador da comissão de pessoas do IBGC e sócio-diretor da People Advisory Services.
Marcelo Godinho: O aumento na criação de comitês de pessoas está intimamente ligado à necessidade de melhorar e qualificar as discussões estratégicas sobre pessoas, de maneira que o comitê funcione como órgão de assessoramento mais estruturado e apropriado, para apoiar os conselhos de administração.
O movimento foi iniciado nos Estados Unidos com os comitês de auditoria, que, a partir da década de 1940, passaram a ser recomendados pela Securities and Exchange Commission (SEC). Mas os dados que temos sobre esse aumento estão relacionados ao Brasil.
Sim. Em 2020, 43% dos participantes de uma pesquisa do IBGC relataram que suas empresas não possuíam políticas ou planos de gerenciamento de crises. Mas a pandemia apontou para novas necessidades e para as responsabilidades do comitê de pessoas que incluem a articulação de temas de gestão de capital humano, da competência do conselho e estratégicos para a organização. Fato é que o arcaico modelo de comando e controle recebeu um verdadeiro choque no curso da pandemia, atraindo um olhar para o maior ativo que qualquer organização possui: o seu corpo de colaboradores. Logo, entendo que a agenda de pessoas foi elevada à categoria de relevância de que é merecedora.
Muitas organizações passaram a repensar seus processos de gestão de performance em função do modelo híbrido, sendo notória a ampliação da discussão acerca de gestão por resultado. Entretanto, é sabido que isso não se opera se o mindset da liderança não evolui. Como toda jornada evolutiva, é um processo que causa disrupção em modelos tradicionais de gestão, mas vejo como um caminho sem volta.
As empresas não estavam preparadas para uma migração em massa para o home office, tanto do ponto de vista tecnológico quanto do ponto de vista cultural. Uma pesquisa do IBGC mostrou que as maiores dificuldades apontadas foram relacionadas a falta da interação humana e dos relacionamentos interpessoais (16%), falta de infraestrutura no domicílio (15,2%), dificuldade para delimitar o horário de trabalho, tornando as jornadas longas (14,7%), dificuldade de conciliar as rotinas de trabalho e doméstica (14,5%), o excesso de reuniões virtuais e telefônicas (11,5%), dentre outros.
Não há resposta de prateleira sobre como gerenciar pessoas distantes e manter o controle dos trabalhos. Se a cultura e o modelo de gestão surgirem como bloqueadores, não há trabalho a distância que sobreviva. É crucial que se faça um processo de escuta ativa dos colaboradores e da liderança, localizando os pontos de convergência, mas em especial onde se encontra a divergência sobre temas que tocam o novo modelo de trabalho. E, em cima disso, buscar traçar uma rota de transformação.
O comitê de pessoas é um órgão de assessoramento, vinculado diretamente ao conselho de administração, de caráter permanente. Ele não tem função deliberativa e atua com independência em relação à diretoria executiva. Os membros precisam ter afinidade com o tema de gestão de pessoas, de modo que sejam capazes de fazer os questionamentos necessários. Vale ressaltar também que, embora o comitê de pessoas lide com os mesmos assuntos de uma área de gestão de pessoas, os focos são notadamente distintos. A atuação do comitê̂ é voltada à agenda estratégica e prospectiva, com o objetivo de subsidiar o conselho.
Nos casos de vacância de cargos, compete ao conselho de administração nomear substitutos, que não integrem a diretoria da organização ou de suas controladas, também não podem ser cônjuges ou parentes de segundo grau dos membros do conselho e, claro, não ocupem cargos em empresas concorrentes.
Os comitês são constituídos pelos conselhos de administração com um determinado mandato, ou escopo de atuação, e prestam contas de seu trabalho de monitoramento, supervisão e assessoramento (formal ou informalmente) por meio da participação em reuniões, da produção de estudos, pareceres, recomendações ou de orientação de políticas.
Os principais desafios apontados por nossos clientes estão na estratégia geral de pessoas a respeito da definição de direcionadores e as capacidades humanas e organizacionais necessárias ao bom desempenho dos negócios; cultura organizacional, como o conjunto de crenças e valores que modelam a forma de pensar, sentir e agir. Saúde, bem-estar e engajamento também são desafiadores. Educação continuada; avaliação de desempenho; gestão de talentos; remuneração; sucessão; diversidade, inclusão e equidade são outros temas.
A sucessão é um processo empresarial que busca assegurar que a gestão disponha de talentos – internos ou externos –, cuja experiência profissional e competências contribuam para a continuidade dos negócios da organização. O conselho deve estruturar, conduzir e acompanhar o processo de sucessão da principal liderança executiva (CEO), dos demais executivos-chave, bem como de seus próprios conselheiros. Essa transição, tanto para organizações quanto para empresas familiares, pode oferecer oportunidades de crescimento, mas também ocasionar desconforto. Para enfrentar esses desafios, tanto a alta cúpula do negócio quanto a família devem se preparar e se alinhar aos modelos de governança estabelecidos.
De acordo com nossas pesquisas, metas demasiadamente ambiciosas podem aumentar o apetite a riscos para além dos níveis estabelecidos pelo conselho de administração, acarretando problemas no longo prazo. Não ter este alinhamento claro com o conselho é um grande risco, não há dúvida.
Três aspectos devem ser levados em conta: é preciso que o órgão tenha um caráter estratégico, agregue capacidade crítica à organização e seja composto, majoritariamente, por membros do conselho. O quadro de profissionais que irão compor o comitê é fundamental para o seu bom desempenho. Seus membros devem dispor de legitimidade, independência, conhecimento e experiência, e capacidade de interlocução com a diretoria executiva e com o conselho. Eles não precisam ser, necessariamente, especialistas em gestão de pessoas, mas devem ter afinidade com o tema e ser capazes de fazer os questionamentos necessários.
Os comitês têm como finalidade o apoio ao conselho de administração, mas não há como medir com indicadores tal eficiência.
O IBGC é referência nacional e uma das principais no mundo em governança corporativa, contribuindo para o desempenho das organizações e temos diversos programas de capacitação, com viés prático – além dos cursos, palestras, fóruns e workshops. O curso “Comitê de Pessoas, Cultura e Governança” tem por objetivo visitar conceitos, princípios e estratégias da gestão de pessoas que contribuem para as boas práticas de governança corporativa; discutir e aprofundar conhecimentos sobre o papel do conselho de administração em assuntos relativos às pessoas; abordar a agenda positiva e seus pilares para promover uma governança que inspira, inclui e transforma.
Saiba mais sobre conselhos de administração e governança corporativa no Fórum Governança 4.0.“