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Deixe os funcionários definirem seu trabalho – o resultado pode surpreender

Quando as pessoas têm liberdade para ajustar suas funções de acordo com seu talento, desbloqueiam a produtividade e a inovação

Benjamin Laker e Stefania Mariano
30 de julho de 2024
Deixe os funcionários definirem seu trabalho – o resultado pode surpreender
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No cenário corporativo atual, a busca por maior engajamento dos funcionários e satisfação no trabalho é imprescindível. As estruturas de trabalho tradicionais, muitas vezes rígidas e com escopo restrito, podem diminuir a motivação, gerar menor produtividade e causar altas taxas de rotatividade.

Por isso, o principal desafio para as organizações é reacender a paixão e a criatividade em sua força de trabalho. Essa necessidade levou ao surgimento de abordagens inovadoras, com o objetivo de transformar os locais de trabalho em ambientes dinâmicos, gratificantes e adaptáveis.

Essas estratégias passam principalmente por capacitar os funcionários, permitindo que eles alavanquem suas habilidades e interesses únicos. Esse empoderamento alimenta um senso de propriedade e renova o entusiasmo no desempenho de seus papéis.

Já ouviu falar em job crafting?

O job crafting (ou construção do trabalho, em tradução livre) é um enfoque proativo em que os funcionários podem ajustar suas funções para trazer mais significado e engajamento ao seu trabalho.

É uma ideia que vai além da formulação convencional, oferecendo aos indivíduos a oportunidade de, na medida do possível, adaptar seus papéis, tarefas e interações para aproveitar melhor seus pontos fortes, paixões e valores pessoais.

Em contraste com a abordagem tradicional da descrição de cargo, feita de cima para baixo, o job crafting é um processo contínuo e com participação ativa do funcionário. Ele pode ser dividido em três componentes principais:

1. Criação de tarefas

A criação de tarefas envolve a alteração da natureza ou o número das tarefas que executam. Isso pode envolver assumir responsabilidades adicionais, alterar a maneira como executam tarefas atuais ou até deixar de realizar as que se encaixam menos com seus pontos fortes ou interesses.

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Por exemplo, um desenvolvedor de software pode ter um forte interesse no design da experiência do usuário. Para alinhar sua função com esse interesse, ele poderia começar a participar das reuniões da equipe de design e contribuir para o aspecto da interface do usuário dos projetos, ainda que mantendo suas principais responsabilidades de programação.

2. Elaboração relacional

A criação relacional trata de alterar a natureza e a extensão das interações com os outros no trabalho. Os funcionários podem buscar mais colaboração com certos colegas ou procurar desenvolver novos relacionamentos que possam aumentar sua satisfação e eficácia no trabalho.

Um exemplo disso seria um representante de atendimento ao cliente que vê valor em entender o processo de desenvolvimento de produtos. Ele poderia começar a interagir mais com a equipe de desenvolvimento de produtos, obtendo insights que poderiam ajudá-los a fornecer um melhor feedback do cliente e melhorar sua eficácia geral.

3. Elaboração cognitiva

A criação cognitiva ocorre quando os funcionários mudam sua percepção do trabalho, concentrando-se nos aspectos que melhor se alinham com seus valores e paixões. Essa ressignificação pode alterar significativamente a forma como eles experimentam seu trabalho e seu nível de engajamento.

Por exemplo, um contador em uma organização sem fins lucrativos pode optar por ver seu papel não apenas como um gerador de informações financeiras, mas como um contribuinte crucial para a missão de impacto social da organização. Essa perspectiva pode aumentar seu senso de propósito e realização em seu trabalho.

Por que implementar o job crafting?

As razões para os gestores implementarem o job crafting são múltiplas e impactantes. Em primeiro lugar, a formulação de um posto de trabalho afeta diretamente o engajamento e o bem-estar dos funcionários. Por exemplo, um profissional de TI pode mudar seu foco para tarefas que ele considere mais criativas, como design de interface do usuário, se isso tiver relação com seus interesses, levando a uma maior satisfação no trabalho.

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Da mesma forma, um vendedor apaixonado por aprendizagem pode dedicar uma parte de seu tempo para treinar novos contratados. Dar aos funcionários autonomia para fazer mudanças em suas atividades leva à redução do estresse e do burnout.

Funcionários engajados que desfrutam de um melhor equilíbrio entre vida pessoal e profissional mostram maior produtividade, entusiasmo e comprometimento.

Eles são mais inovadores, muitas vezes sugerindo melhorias no sistema ou ideias de novos produtos, e são mais propensos a permanecer na organização, reduzindo as taxas de rotatividade.

> O job crafting contribui para uma cultura organizacional positiva. Cria um ambiente de autonomia, incentivando os funcionários a tomarem iniciativas e inovar.

Por exemplo, a famosa política de “20% de tempo” do Google, em que os funcionários podiam dedicar uma parte de sua semana de trabalho a projetos fora de suas descrições de trabalho principais, levou a inovações significativas.

Em segundo lugar, o aspecto relacional da elaboração de trabalhos permite que as pessoas construam relações de trabalho mais fortes e eficazes. Um gerente de projeto, por exemplo, pode optar por interagir com mais frequência com a equipe de marketing para entender melhor as necessidades do cliente, aumentando assim a colaboração.

Isso poderia levar a uma dinâmica de equipe mais coesa e a um ambiente de trabalho mais integrado. Além disso, o job crafting contribui para uma cultura organizacional positiva. Cria um ambiente de autonomia, incentivando os funcionários a tomarem iniciativas e inovar.

> Em setores dinâmicos, como a tecnologia, funcionários que estão acostumados a remodelar suas funções podem se ajustar rapidamente às novas tecnologias e às demandas do mercado. Essa cultura positiva não só atrai talentos de alta qualidade, mas também aumenta a reputação da organização como um lugar desejável para trabalhar.

Empresas como a Zappos (varejista online de calçados e roupas nos Estados Unidos) capacitam os funcionários para remodelar suas funções, levando a altos níveis de satisfação e a uma cultura empresarial invejável.

Por fim, o job crafting torna as organizações mais adaptáveis às mudanças. Em setores dinâmicos, como a tecnologia, onde a mudança rápida é a norma, os funcionários que estão acostumados a remodelar suas funções podem se ajustar rapidamente às novas tecnologias e às demandas do mercado.

Além disso, esse processo permite um melhor alinhamento entre metas pessoais e objetivos organizacionais. Por exemplo, um representante de atendimento ao cliente com talento para mídias sociais pode assumir funções que envolvam engajamento pelas redes, alinhando seus interesses pessoais com o objetivo da empresa de incrementar sua presença digital.

Isso faz com que os esforços dos funcionários contribuam de forma mais eficaz para o sucesso da organização, o que torna a força de trabalho mais eficiente e orientada por objetivos.

Essa perspectiva é evidente em empresas como a Adobe (empresa de software dos Estados Unidos), onde a criatividade e a iniciativa individuais estão alinhadas com objetivos organizacionais mais amplos, levando ao crescimento pessoal e corporativo.

Desafios e considerações do job crafting

Embora o job crafting ofereça inúmeros benefícios, ele também apresenta desafios, como Benjamin descobriu ao escrever seu novo livro, Job Crafting:

Equilíbrio

Uma delas é manter o equilíbrio entre a autonomia do funcionário na elaboração de suas funções e o cumprimento das funções e objetivos essenciais do trabalho.

Os gestores devem acompanhar cuidadosamente esse processo para garantir que as principais responsabilidades dos funcionários e os objetivos de seus cargos não sejam comprometidos quando eles personalizam suas funções.

Equidade

Outra consideração significativa é a gestão da justiça e equidade dentro das equipes. É vital que a gestão monitore e previna qualquer percepção de desigualdade que possa surgir à medida que alguns funcionários modificam seus papéis, o que pode levar à insatisfação ou conflito entre os membros da equipe.

Suporte

Além disso, é essencial fornecer suporte e orientação adequados. Os gestores devem ajudar ativamente as pessoas no processo de formatação do trabalho, oferecendo recursos e conselhos para ajudá-los a remodelar suas funções de forma eficaz e sustentável. Esse suporte garante que a reelaboração de trabalhos contribua positivamente para os objetivos individuais e organizacionais.

O job crafting representa uma mudança de paradigma na forma como pensamos sobre o trabalho e o engajamento dos funcionários. Ao capacitá-los para adaptar suas atividades e papéis para se alinharem aos seus pontos fortes, paixões e valores pessoais, as organizações podem desbloquear uma riqueza não prevista, desde o aumento da produtividade e inovação até a melhoria do bem-estar e retenção dos funcionários.

Para os líderes que procuram construir uma força de trabalho mais dinâmica, engajada e adaptável, o job crafting é um conceito que vale a pena considerar.

Benjamin Laker e Stefania Mariano
Benjamin Laker é professor de liderança na Henley Business School da University of Reading e coautor de "Job Crafting" (MIT Press, 2024). Stefania Mariano é professora associada de administração na American University of Sharjah nos Emirados Árabes Unidos.

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